ONGs lançam Pacto Nacional pelo Combate às Desigualdades no Brasil

 

 

Assinado por dezenas de organizações da sociedade civil, o Pacto reúne iniciativas a nível municipal, estadual e federal para o combate aos diversos tipos de desigualdades

pacto combate às desigualdades
Foto: Adobe Stock

A partir do consenso de que é urgente transformar o combate às desigualdades em prioridade nacional, pois elas são anticonstitucionais, injustas e letais, dezenas de organizações da sociedade civil brasileiras estão articuladas em um novo movimento coletivo: o Pacto Nacional pelo Combate às Desigualdades. A iniciativa foi lançada no dia 30 de agosto, em Brasília, e já ganhou o apoio de associações de municípios, centrais sindicais, instâncias governamentais do Executivo e Legislativo federal, estadual e municipal, e do Poder Judiciário.

Coordenado pela Ação Brasileira de Combate às Desigualdades (ABCD), o Pacto conta com iniciativas como: o Observatório Brasileiro das Desigualdades em parceria com o CEBRAP; a Frente Parlamentar de Combate às Desigualdades; o Prêmio de Combate às Desigualdades para municípios com bons resultados; o lançamento de publicações com propostas para municípios, empresas e sindicatos de trabalhadores atuarem para enfrentar as desigualdades; e a apresentação de um mapa das desigualdades entre as capitais brasileiras.

Entre os projetos, destaca-se o Observatório Brasileiro das Desigualdades. A ferramenta trará um diagnóstico da situação atual das desigualdades brasileiras a partir do levantamento de dados relativos a indicadores em 12 áreas. São eles: raça; gênero; desigualdade territorial; renda, riqueza e trabalho; educação, saúde, acesso a serviços básicos; segurança alimentar; clima e meio ambiente; segurança pública; desigualdades urbanas; e desigualdade de representação política. Além de monitorar os avanços e retrocessos dos indicadores, o Pacto deverá acompanhar políticas públicas e cobrar resultados de forma contínua.

“Acreditamos que esta situação de desigualdades crônicas, racismo e opressão de gênero só poderá ser superada por meio de uma ação articulada e solidária de toda a sociedade. O país viveu um momento de retrocessos sociais, políticos, ambientais, econômicos e culturais em grande escala e intensidade. As perdas ocorreram em todas as direções, aumentando a pressão sobre a sociedade civil e os movimentos sociais e culturais das cidades e dos territórios rurais”, justificam as organizações.

Fazem parte da coalizão organizações como a Associação Brasileira de ONGs (Abong), Ação da Cidadania, CENPEC, Dieese, GIFE, Instituto Marielle Franco, Instituto Cidades Sustentáveis, Oxfam Brasil, TETO Brasil.

As atividades promovidas pelo Pacto estão alinhadas ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 10, meta da Agenda 2030 da ONU que incentiva ações de combate às desigualdades em todo o mundo.

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3ª Marcha das Mulheres Indígenas defenderá a vida

Por Nicoly Ambrosio | Via Amazônia Real

Manaus (AM) – Guiadas pela consciência da importância dos seis biomas brasileiros para o equilíbrio e a existência da biodiversidade, mais de 5 mil mulheres indígenas de todos os Estados devem ocupar as ruas de Brasília (DF), entre 11 e 13 de setembro, para a 3ª Marcha das Mulheres Indígenas. O tema escolhido para este ano, “Mulheres Biomas em Defesa da Biodiversidade pelas Raízes Ancestrais”, é a reafirmação da luta feminina pela preservação dos territórios indígenas, a fim de proteger também a existência dos povos.

“Nossa luta não protege somente o clima, a floresta e as riquezas naturais, ela protege o nosso modo vida. Quando lutamos pela mata atlântica, caatinga, pampa, cerrado, pantanal e Amazônia, lutamos pela vida dos povos indígenas que vivem e dependem desses biomas, para manterem suas culturas e tradições. Esses biomas são nossas farmácias naturais, é de onde tiramos nossas ervas medicinais, o nosso alimento tradicional e as matérias para produção de nossos artesanatos”, diz Lucimara Patté, cofundadora da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) e uma das organizadoras do evento.

O encontro é organizado pela Anmiga e pelas Mulheres Biomas de todo o País. As lideranças femininas pretendem debater temas como emergências climáticas, violência de gênero, violência política, saúde mental, acessibilidade indígena à educação e a importância das mulheres indígenas na COP28, que será realizada entre 30 de novembro e 12 de dezembro deste ano em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.

Como parte da jornada de luta por direitos, em 2022, na Caravana das Originárias da Terras, as mulheres indígenas promoveram encontros em 27 territórios brasileiros promovendo ações de fortalecimento, protagonismo, acolhimento e reflexão sobre a importância dos biomas e territórios brasileiros.

Em janeiro de 2023, elas realizaram a Pré-Marcha das Mulheres Indígenas, sob o tema “Vozes da ancestralidade dos 6 biomas do Brasil”. Mais de 200 mulheres estimularam debates coletivos sobre a perspectiva da política indígena na construção e manutenção de  direitos em nível nacional. Foi também o primeiro momento para discutir as demandas, propostas e programações da 3ª Marcha das Mulheres Indígenas.

                                            Lideranças mulheres dos seis biomas do Brasil durante a Pré-Marcha, em janeiro de 2023 (Foto: Puré Juma/Jovem Cidadão/Amazônia Real).

Desde o início da jornada, o que se viu é que as mulheres indígenas ocuparam a política brasileira por meio  da chamada “Bancada do Cocar”. Foram 17 candidaturas de indígenas nas eleições de 2022 a deputadas federais e estaduais. “Testemunhamos a vitória histórica das nossas mulheres terra Sônia Guajajara e Célia Xakriabá, que hoje estão nos representando no Ministério dos Povos Indígenas e na Câmara dos Deputados”, destaca a coordenação da Anmiga.

Segundo Lucimara Patté, a 3ª Marcha das Mulheres Indígenas tem o objetivo de “conectar e reconectar a potencialidade das vozes das ancestralidades que são as sementes da terra”. A partir da marcha, as mulheres indígenas propõem o fortalecimento da atuação política e dando início a novos diálogos de incidência na política indígena do Brasil.

“A 3ª Marcha das Mulheres Indígenas vem para consolidar a força, a união e a luta das mulheres indígenas, que estiveram e estão nesse processo de ocupação de espaços políticos e estratégicos. A nossa marcha é um ato político de resistência, somos muitas e juntas estaremos ecoando nossas vozes carregadas de reivindicações”, afirma Lucimara.

As mulheres indígenas também querem ocupar mais espaços de poder, como o Congresso. “Precisamos estar em todos os espaços, pois não aceitamos mais um Brasil sem nós. Não queremos mais homens brancos decidindo sobre nossas vidas e direitos, queremos nossa presença e nossa voz ecoando nesses espaços”, manifesta a liderança.

Essa é a primeira Marcha das Mulheres Indígenas que acontece no terceiro governo Lula (PT). Nas duas edições passadas, que aconteceram durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, as mulheres indígenas sofreram ameaças, ataques e perseguições de bolsonaristas. Na edição de 2021, o acampamento das mulheres chegou a ser invadido. Lucimara acredita que, apesar da mudança de governo, o bolsonarismo ainda existe na sociedade e as indígenas não descartam ataques.

“A 3ª Marcha será no governo Lula, o qual o movimento indígena apoiou, porém não temos a ilusão de que, por estarmos em um governo de esquerda, não haverá algum tipo de ataque. Tiramos o Bolsonaro do poder, mas ainda não acabamos com o bolsonarismo. Estamos nos preparando para esses tipos de imprevistos, nossa equipe de segurança está pronta para fazer a proteção do acampamento e dos corpos das mulheres indígenas presentes na marcha”, afirma Lucimara.

Demarcação é prioridade

A pauta central do movimento das mulheres indígenas na 3ª Marcha das Mulheres Indígenas é a demarcação dos territórios, alinhada ao movimento nacional. O final do julgamento sobre o marco temporal, tese que tem como objetivo limitar demarcações de Terras Indígenas no Brasil até a data-limite de 1988, irá nortear o evento.

“Nós mulheres indígenas temos reforçado a importância da demarcação, tendo em vista que os territórios em processo de retomada são constantemente atacados, e nós, as mulheres, somos as primeiras a terem nossos direitos violados. Não há possibilidade de haver saúde, educação e segurança sem território demarcado, por essa razão estamos lutando e reivindicando que a tese do marco temporal seja derrubada pelo STF”, denunciou a liderança Lucimara Patté.

                                                    Mobilização dos povos indígenas no dia 30 de agosto em Brasília contra o Marco Temporal (Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil).

O julgamento da tese do marco temporal está suspenso no Supremo Tribunal Federal (STF) neste momento, com previsão de retorno no dia 20 de setembro.

Nesta terça-feira (5), Dia da Amazônia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o decreto de demarcação de duas novas terras indígenas, a do Rio Gregório (em Tarauacá, no Acre), pertencente aos povos Katukina e Yawanawá, e a de Acapuri de Coima (em Fonte Boa, no Amazonas), dos Kokama. Em abril, Lula já havia assinado a homologação de outras seis TIs (última etapa antes do registro formal da terra).

Em cerimônia no Palácio do Planalto, acompanhado das ministras Marina Silva e Sônia Guajajara, Lula assinou decreto que retoma a Câmara Técnica (CT) de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais, agora sob a coordenação do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). Se funcionar, a CT terá poder deliberativo para reconhecer os direitos dos povos indígenas e quilombolas sobre terras tradicionalmente ocupadas. Ainda como ato simbólico, o presidente assinou os decretos para criação de duas novas Unidades de Conservação em Roraima, a Floresta Nacional do Parima, em Amajari, e a Parque Nacional do Viruá, em Caracaraí.

Em entrevista à agência Gov, a ministra Marina Silva afirmou que o Dia da Amazônia serve para a tomada de consciência da importância de preservar o bioma. “A Amazônia é muito grande, tem lugar para o indígena, o extrativista, o agronegócio, o ecoturismo, a bioeconomia, desde que respeitando a todos”, afirmou.

Movimentos de base 
                                                         Mobilização durante a II Marcha das Mulheres Indígenas no ano de 2021 (Foto: Leonardo Milano/ Jornalistas Livres).

As reivindicações da 3ª Marcha buscam a consolidação e o fortalecimento da presença de mulheres indígenas em diferentes espaços de representatividade. Isso inclui políticas públicas elaboradas com e para os indígenas, a diminuição ou anulação das violências físicas e estruturais dentro e fora dos territórios e o apoio à Bancada do Cocar. Outro ponto é garantir a independência das indígenas e a inserção de mulheres, jovens e mães nos espaços acadêmicos com apoio pedagógico, psicológico e financeiro.

Diretora-presidente da Associação de Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro (AMARN), da Rede Makira-Êta (Rede de Mulheres Indígenas do Amazonas), a liderança Clarice Tukano foi indicada para representar os 9 Estados da Amazônia Legal como Mulher Focal na 3ª Marcha das Mulheres Indígenas, atuando junto a coordenação nacional  da Anmiga. Para ela, a participação das mulheres indígenas da Amazônia no evento é de “suma importância, porque conjuntamente temos força para propor  as nossas demandas enquanto pertencentes ao Bioma Amazônia, contra o desmatamento, contra empresas de mineração, construção de grandes hidrelétricas, etc. Nosso intuito é defender a biodiversidade, que é nossa temática central da marcha”, disse.

As mulheres da Amazônia pretendem lançar durante a 3ª Marcha, livros e sites sobre os indígenas do bioma, com apoio da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn). Elas também terão grupos de trabalho temático por biomas, tratando a emergência climática, biodiversidade e reflorestamento. “Estaremos marcando presença nas ruas de Brasília com nossas palavras de ordem: Demarcação Já e  Não ao Marco Temporal”, destacou Clarice Tukano.

Segundo Clarice, mais de 100 mulheres estão se organizando para sair do Amazonas em direção à Marcha, em Brasília. “Estamos organizando de diversas formas de participar. Como na maior parte da Amazônia a logística é via aérea, muitas vezes dificulta para uma participação mais expressiva. Com toda dificuldade, cada um dos 9 Estados da Amazônia Legal estão conseguindo se mobilizar com seus parceiros locais”, afirmou a liderança.

Sem apoio financeiro, a Anmiga organizou uma vaquinha online para custear alimentação e transporte para a 3ª Marcha das Mulheres Indígenas. “As mulheres foram instruídas a se organizarem e procurarem apoios para sua vinda, muitas delas articularam e conseguiram através de vaquinha e apoio das secretarias estaduais. Mas muitas caravanas encontraram dificuldades e não conseguiram apoio, devido a isso a Anmiga buscou recursos com apoiadores para suprir as demandas de logística dessas mulheres, para elas participarem da Marcha. Arrecadar recurso tem sido a nossa maior dificuldade”, disse uma das coordenadoras do evento, Lucimara Patté.

Para Clarice, a falta de financiamento financeiro é uma das maiores dificuldades para irem à 3ª Marcha das Mulheres Indígenas. Além da falta de diálogo com o movimento das mulheres indígenas, que Clarice acredita ser ignorado por instituições do governo, os valores de logística de viagem à região Amazônica são altos e dificultam o apoio.

“O que diz respeito à mobilização política de mulheres indígenas, ninguém quer financiar. Quando falamos da crise climática, porque nós mulheres indígenas de fato estamos fazendo frente para frear a crise de aquecimento de clima, apenas alguns atendem e se dispõem a nos ajudar, mas requer muito diálogo para que disponha as passagens e alimentação, que na nossa região amazônica são valores elevados para logística. Isso dificulta bastante para nossa participação”, alertou. Para apoiar a luta das mulheres originárias, entre neste link.

 

Mobilização durante a II Marcha das Mulheres Indígenas em setembro de 2021 (Foto: Matheus Alves/ Cobertura Colaborativa

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Nota de luto e de luta! Mãe Bernadete, presente!

A Abong, Associação Brasileira de ONGs, que congrega centenas de organizações em defesa da democracia e dos direitos humanos de todo o país, está em luto e em luta após a notícia do assassinato de Maria Bernadete Pacífico, Mãe Bernadete, coordenadora nacional da CONAQ, ialorixá do Ilê Axé Odé Omí Ewá e liderança quilombola do Quilombo Pitanga dos Palmares, na noite desta quinta-feira (17), em seu terreiro em Simões Filho, região metropolitana de Salvador (BA). 

Mãe Bernadete era uma defensora dos direitos humanos e dos direitos dos povos quilombolas. Uma liderança incansável da luta pela regularização fundiária de territórios historicamente ocupados por seus ancestrais. Sua trajetória também foi marcada pela busca por justiça para seu filho Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo, outro defensor de direitos que foi brutalmente assassinado há 6 anos. 

As mortes de Bernadete e Binho expõem como o racismo, a intolerância religiosa e a disputa por terras submetem  povos e comunidades tradicionais a uma condição extrema de marginalização que coloca em risco milhares de vidas. Um levantamento da Rede de Observatórios de Segurança, aponta a Bahia na segunda posição no raking de estados  brasileiros mais violentos para estes territórios e comunidades tradicionais. 

A Abong lamenta profundamente o ocorrido e exige que o Governo  brasileiro tome medidas legais imediatas de proteção ao Quilombo de Pitanga de Palmares e suas lideranças. É necessário que as autoridades locais garantam uma rápida e independente investigação e que os suspeitos de responsabilidade criminal sejam localizados e encaminhados à Justiça  . 

Nossos sentimentos estão com o Quilombo Pitanga dos Palmares, com todas as famílias, amizades e afetos de Mãe Bernadete, assim como as companheiras e companheiros da CONAQ e da luta quilombola. Sua memória e história de dedicação a uma sociedade radicalmente democrática ressoa em  nós e nos apoia na luta por respostas e para a preservação de seu legado. Ainda assim, sua ausência será profundamente sentida. 

Em nome dos coletivos estaduais da Abong, de nossas associadas e diretoria, manifestamos nossa indignação e exigimos justiça. 

Nos encontramos na luta!

 

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Um abraço, Betinho

 

Por Athayde Motta

Antropólogo, diretor do Ibase e da Abong

Amanhã, dia 9 de agosto, faz 26 anos da morte do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, fundador do Ibase e inspirador de outras tantas iniciativas de exercício da cidadania e combate às desigualdades. Desde sua partida, fazemos algo para celebrar seu legado e reafirmar sua importância e presença para o Ibase. Em 2023 optamos por colocar um painel com a imagem de Betinho em nossa nova sede. A frase “Um abraço, Betinho” era como ele assinava suas correspondências – fossem destinadas a um(a) voluntário(a) na distribuição de cestas básicas ou a uma autoridade pública. Betinho não diferenciava pessoas, mas sabia extrair o melhor de cada uma delas.

O painel foi instalado na nova sede do Ibase.

Trata-se de uma homenagem mas principalmente de uma forma de preservar sua inspiração constante, de manter vivo seu caráter criativo e inovador em nossos projetos e ações cotidianas. Quem conviveu com Betinho jamais esquecerá esse olhar que sempre traduziu tão bem sua indignação diante das injustiças e sua força intelectual para buscar soluções possíveis para melhorar a vida de quem mais precisa.

Como sociólogo, Betinho soube unir o saber acadêmico, a avaliação de políticas públicas e o engajamento de todos(as) nas mudanças que tanto defendia.

Betinho lutou pela liberdade de expressão, lutou contra a fome e a miséria, lutou contra o abandono de nossas crianças, lutou contra a privatização dos serviços públicos, lutou contra a disseminação da Aids. Betinho lutou inclusive pela própria vida, pois como hemofílico sua batalha pela sobrevivência foi diária.

A nós, que somos parte de seu inesquecível legado, não nos resta outro caminho a não ser lutar também. Ao longo de mais de 40 anos, o Ibase segue atuando firmemente para que a democracia e a cidadania sejam – de fato – vividas por cada brasileiro e brasileira.

Os cinco princípios da democracia elencados por Betinho – Igualdade, Liberdade, Diversidade, Solidariedade e Participação – são valores que cultivamos todos os dias.

O abraço que Betinho deixou segue a nos inspirar.

 

Por: https://ibase.br/um-abraco-betinho/

 

 

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Encontro sobre indústrias extrativas acontece no Ibase

Por Ibase

De 11 a 13 de julho, o Ibase sediará o encontro Perspectivas da Política Energética e Extrativista na América Latina e no Caribe, promovido pela Rede Latino-americana de Indústrias Extrativas (Rlie). O evento acontece pela primeira vez no país e reunirá cerca de 30 especialistas vindos da Bolívia, Colômbia, Equador, Guatemala e Peru – além de brasileiros(as). À frente da organização do encontro estão Ibase e o Centro de Estudos para o Desenvolvimento Agrário e do Trabalho (Cedla), na Bolívia.

O encontro servirá como oportunidade para que as organizações da sociedade civil de diferentes países latino-americanos discutam propostas de políticas públicas relacionadas às atividades de mineração, petróleo e gás, levando em conta os impactos na vidas das pessoas que moram em regiões afetadas por tais práticas. “Queremos identificar as principais características e tendências da política energética e extrativa no nosso continente, principalmente em um cenário de crise econômica, pós-pandemia e disrupção tecnológica” – explica Athayde Motta, diretor do Ibase e representante brasileiro na Rlie.

Motta ressalta a urgência do debate sobre as indústrias extrativas: “O modelo de desenvolvimento adotado nas últimas décadas coloca o planeta sob intensa pressão no que diz respeito às fontes de matérias-primas e energia. Estaremos com representantes de organizações que, por meio de pesquisas e ações de advocacy em espaços regionais e globais, atuam diretamente na construção de visões e ações alternativas a esse atual modelo dependente de indústrias que violam os direitos das pessoas e do planeta”.

Segundo Thuani Queiroz, pesquisadora do Ibase que está também na organização do encontro, inicialmente as atividades são apenas para convidados(as) mas existe a possibilidade da participação online para estudiosos(as) e outros(as) interessados(as) no tema: “Não faremos transmissão ao vivo, mas podemos enviar um link de participação para quem nos contactar previamente. Basta enviar uma mensagem para o e-mail petc@ibase.br e daremos as coordenadas” – explica.

O evento acontece no Galpão da Cidadania – rua da Gamboa, 246, Santo Cristo, Rio de Janeiro –  de 11 a 13 de julho, sendo que os dois últimos dias serão apenas para associados(as) à Rlie.

Algumas publicações e estudos sobre o tema das indústrias extrativas podem ser consultados aqui:

Terras Raras e Nióbio no Brasil

Contradições do Desenvolvimento e o Uso da CFEM em Canaã dos CarajasPA

Em busca da Transparência: Desvendando o Setor Extrativo Brasileiro – resumo do relatório

Impactos Ecossociais do empreendimento Anglo-American

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Um novo pacto financeiro global

por: https://ibase.br/um-novo-pacto-financeiro-global/

 

Athayde Motta, antropólogo, diretor do Ibase e membro da diretoria executiva da Abong  

Convocada pelo governo da França, a Cúpula por um Novo Pacto Financeiro Global acontecerá em Paris nos dias 22 e 23 de junho. Além de encontros entre mais de 100 chefes de Estado, está prevista a participação de mais de 40 organizações internacionais e cerca de 120 ONGs e coalizões de ONGs de todo o mundo. A Associação Brasileira de ONGs (Abong) estará presente no evento como parte do Comitê Executivo do Forus, uma rede global que reúne 67 plataformas nacionais de ONGs e sete coalizões regionais que congregam mais de 22 mil organizações. Junto com Pedro Bocca, assessor internacional da Abong, estarei presente como membro da diretoria executiva da instituição e diretor do Ibase.

O principal objetivo do encontro é construir um novo consenso global em torno de um sistema financeiro internacional mais inclusivo. Questões como a crise climática, a pandemia da Covid-19 e o crescimento recorde da dívida externa em todos os países têm contribuído para um quadro de volatilidade financeira cujos principais impactos são a reversão da tendência de diminuição da pobreza global, o fracasso dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e a incapacidade de reduzir os níveis de aquecimento global.

A Cúpula por um Novo Pacto Financeiro Global também permitirá discussões sobre as condições necessárias para atingir a sustentabilidade e reduzir a pobreza por meio de políticas e acesso a recursos financeiros que enfrentem as mudanças climáticas, a perda da biodiversidade e a degradação ambiental. Serão abordadas, ainda, agendas que serão discutidas em sua totalidade na reunião de líderes do G20, em setembro, na Índia, e na COP28, nos Emirados Árabes Unidos. Um dos temas mais polêmicos é a agenda de reformas de instituições financeiras internacionais, que, de acordo com alguns especialistas, inclui as instituições financeiras de desenvolvimento e os bancos multilaterais de desenvolvimento.

Agenda da sociedade civil 

Para algumas organizações que participarão do encontro, é preciso mobilizar recursos financeiros e políticos consideráveis para lidar com os múltiplos desafios colocados pela atual crise do sistema financeiro internacional. Os países ricos têm falhado em cumprir suas promessas de financiar programas de desenvolvimento que auxiliem países menos desenvolvidos a lidar com a crise climática e com o aumento da pobreza. É necessário mobilizar recursos que reformem estruturalmente a arquitetura financeira internacional.  Nem todas as soluções recomendadas pelos países ricos são aprovadas pelas sociedades civis do Sul Global. Medidas como o investimento na infraestrutura verde e estimular o crescimento do setor privado em países de baixa renda tem sido criticadas como meios que privilegiam o acúmulo de riqueza entre atores públicos e privados do Norte global, aprofundando as desigualdades com os países do Sul global.

Campanhas têm sido implementadas por várias redes de OSCs globais lidando com temas tão variados como a supertaxação das empresas de petróleo, consideradas como algumas das mais poluentes do planeta; a reforma dos bancos multilaterais de desenvolvimento; e a reforma da arquitetura financeira global. Há também críticas quanto as perspectivas de que essa Cúpula atinja os ambiciosos objetivos a que se propõe. Um documento provisório preparado pelos organizadores da Cúpula e que vazado sugere que a maior parte das questões permanece sem resposta e não há sequer a clareza que haveria uma declaração formal ao final do evento. O documento também mencionaria investimentos da ordem de US 100 bilhões por ano em garantias para os países de baixa renda. No entanto, promessas de quantia semelhante em anos anteriores não foram cumpridas.

Em outra iniciativa, 70 economistas internacionais apoiam a criação de um imposto internacional sobre transações financeiras. As estimativas são de que poderiam ser arrecadados cerca de EUR 260 bilhões por ano se o imposto fosse aplicado a todos os países do G20. Outras propostas similares incluem uma taxa sobe a importação de petróleo, uma taxa para navios e aviões sobre sua pegada de carbono e uma outra taxa sobre a extração de petróleo.

A oportunidade de debate está dada. E trata-se sim de um esforço necessário e urgente. Aguardemos para saber se os resultados serão tão grandiosos quanto os objetivos até agora divulgados.

Foto: Samuel Tosta/Arquivo Ibase.

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Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil ganha quatro novos integrantes

Os novos integrantes são Luciana da Cruz Brito, Iara Pietricovsky, Graciela Seleiman e Clemente Gánz Lúcio, que terão mandato de três anos.

O Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil está de cara nova. A partir desta quarta-feira (31/5), tomam posse quatro novos conselheiros no grupo que é responsável por definir a estratégia da organização, escolher sua direção executiva em conjunto com a assembleia geral, e monitorar e avaliar riscos organizacionais. O Conselho é composto por até sete membros, cada um com mandato de três anos, que podem ser renovados por mais um período.

Os novos membros são:

 

Luciana da Cruz Brito: professora adjunta do curso de graduação e pós-graduação em história da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Possui doutorado em história pela Universidade de São Paulo com estágio doutoral pela New York University com bolsa Fulbright (2011), e pós-doutorado pela City University of New York (2016). Desenvolve pesquisas sobre escravidão, abolição e relações raciais no Brasil e Estados Unidos. É autora do livro Temores da África: segurança, legislação e população africana na Bahia oitocentista, ganhador do Prêmio Thomas Skidmore de 2019. É colunista no Nexo Jornal.

 

Graciela Seleiman: jornalista especializada em gênero e desenvolvimento local, mestre em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com atuação de mais de 20 anos nas áreas de tecnologias digitais, comunicação, direitos humanos e justiça social. Foi uma das fundadoras e diretoras do Instituto Nupef, organização de pesquisa e advocacy em direitos digitais e governança da internet. Foi diretora da Fundação Ford entre 2013 e 2021. Desde 2021, é líder da IRIS (International Resource for Impact and Storytelling) para a região da América Latina, apoiando o fortalecimento de ecossistemas e estratégias que promovam narrativas transformadoras de justiça social e ambiental.

 

 

 

 

Iara Pietricovsky de Oliveira: mestre em Ciência Política, bacharel em Ciência Sociais com especialização em Antropologia, atriz e ativista. Foi co-diretora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC) por 20 anos, onde atuou como assessora das questões indígena, socioambiental, internacional e de cooperação. Foi co-diretora da Associação Brasileira de ONGs (Abong) e presidente do FORUS, articulação global de defesa do espaço cívico composta por mais de 22 mil organizações não governamentais do mundo.

 

Clemente Gánz Lúcio: sociólogo formado pela Universidade Federal do Paraná, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável (CDESS) da Presidência da República e também do Conselho de Administração do Centro de Altos Estudos Brasil Século XXI.

Luciana, Iara, Graciela e Clemente se juntam aos atuais membros do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil, Helio Santos (presidente), Bianca Santana e Mário Theodoro. Assim, a composição do Conselho passa a ser de 4 mulheres e 3 homens, 4 pessoas negras (dois homens negros e duas mulheres negras) e 3 pessoas brancas.

 

A Oxfam Brasil aproveita para agradecer a inestimável contribuição de dois integrantes que estão deixando o Conselho Deliberativo, devido ao fim de seus mandatos: Andre Degenszajn e Maria Abramo Caldeira Brant. Ambos estiverem com a organização desde o início de sua operação no Brasil em 2015 e foram de fundamental importância para o desenvolvimento do nosso trabalho por um país mais justo e menos desigual.

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O SILÊNCIO NÃO É UMA OPÇÃO PARA A SOCIEDADE CIVIL: NÃO À MP N° 1.154 E AO PROJETO DE LEI Nº 490

A Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais no Estado de
Pernambuco (ABONG PE) e suas filiadas vêm, por meio desta nota, manifestar sua posição
em defesa da democracia, dos direitos humanos, da justiça socioambiental e do
desenvolvimento sustentável. Reconhecemos os povos originários, em especial os povos
indígenas e quilombolas, como guardiãs das florestas e do território brasileiro, e defendemos
seus direitos e sua participação ativa na tomada de decisões que afetam suas vidas e seus
territórios.

Repudiamos veementemente os retrocessos que o povo brasileiro tem sofrido,
resultantes de uma política de retirada de direitos, liderada pelas bancadas conservadoras do
Congresso Nacional, que representam as elites do agronegócio. Essa agenda de retrocesso
ameaça a democracia e a soberania do Estado brasileiro, comprometendo os avanços
conquistados ao longo de décadas de lutas e mobilizações populares que vem causando os
impactos naturais responsáveis pelas mudanças climáticas.

É preciso ter ciência que as decisões políticas propostas pela Medida Provisória 1154
e o Projeto de Lei 490 restringem o direito à terra e ameaçam a existência dos povos
indígenas brasileiros que, a duras penas, lutam diariamente para sobreviver ao genocídio e o
epstemicídio (que já duram mais de 500 anos). Tais medidas retiram atribuições dos
Ministérios dos Povos Indígenas e do Meio Ambiente, colocando em risco a preservação
ambiental e a garantia dos direitos dos povos indígenas, que já enfrentam inúmeras
dificuldades para manter suas terras e seus modos de vida.

Nesse contexto, é fundamental ressaltar a importância da resistência e do apoio das
organizações da sociedade civil na defesa dos povos originários. Convocamos a sociedade em
geral a se unir à causa e à luta da população indígena e seus territórios. Entendemos que a
solidariedade e a mobilização são essenciais para enfrentar os desafios e barrar as ameaças
que colocam em risco a cultura e a existência desse povo.

A ABONG PE reafirma seu compromisso em defender os direitos humanos, a justiça
socioambiental e a sustentabilidade, em consonância com os princípios da democracia.
Somente com a união de todas, todos/es, seremos capazes de garantir a proteção dos povos
indígenas e a preservação do meio ambiente, construindo um futuro mais justo e igualitário
para todas as pessoas que vivem sob este céu e compartilham desta terra.

Neste momento, o silêncio não é uma opção para a sociedade civil!!! Repudiamos a
MP N°1.154 e o Projeto de Lei N°490

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Juntas No Poder

Dia 24 de fevereiro de 1932 foi um marco na história das mulheres brasileiras. Foi neste dia que aconteceu a primeira sanção eleitoral que garantiu oficialmente às mulheres a liberdade de votar e de serem votadas.

Hoje, 90 anos depois, enxergamos a necessidade do aumento na pluralidade, diversidade e representatividade de corpos e histórias no contexto político de nosso país.

Lutamos pela participação feminina no cenário político, sendo protagonistas das lutas, e ocupando os espaços de poder.

A luta também é por permanência e segurança para que mulheres no campo político-eleitoral sejam autoras de suas trajetórias.

Neste 8M estaremos Juntas No Poder, mostrando que a democracia se faz real quando todas se fazem cara e coragem!

 

Confira Aqui os Vídeos da Campanha

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O cinema-sentipensamento das mulheres indígenas

Recém-lançada, a Rede Katahirine – ‘constelação’ de realizadoras – articulará espaços políticos. “O cinema indígena é uma armadilha de caçar: no caso, nós somos a caça”, explica coordenadora, mostrando como telas se tornam campos de luta.

Realizadoras indígenas. Foto obtida na página do Instituto Catitu

PorSophia Pinheiro, entrevistada porMaurício Ayer

“Ver não apenas com os olhos, mas com todo o corpo e sentimento, ver com os olhos dos pássaros, da capivara, da onça, ver como veem fungos, plantas, divindades; fazer as imagens de outro modo, em colaboração com as pessoas e outros agentes do mundo visível e invisível, encantando as imagens e o pensamento, criando teias de afeto e sonhos.” Assim Sophia Pinheiro descreve o modo como essas mulheres dão luz aos seus olhares em um cinema que certamente terá agora um espaço próprio para se pensar e conquistar espaço político e cultural na sociedade brasileira.

Juntamente com Mari Corrêa e Helena Corezomaé, Sophia coordena daRede Katahirine, lançada no último sábado em evento virtual (como noticiou Outras Palavras), congregando 76 mulheres indígenas cineastas. A rede foi concebida pelo Instituto Catitu, dirigido por Mari, como resultado de muitos anos de trabalho em oficinas de audiovisual com mulheres originárias, e se materializou com a articulação das coordenadoras, conselheiras e outras dezenas de realizadoras.

Nesta entrevista com Sophia, conhecemos como essa rede se formou e o que ela pretende. “Antes de querer ser cinema, os filmes indígenas no Brasil são sobretudo sociopolíticos, ações comunitárias de reconhecimento, comunicação interna, enfrentamento diante do mundo não indígena e trocas de saberes, conectados ao pensamento, primeiro, político e, partindo daí, estético”, explica. Esse modo de fazer filmes tem ressonância nos próprios objetivos da Rede. Conforme escreveu o Conselho:

Acreditamos que a rede poderá ser uma importante ferramenta de conhecimento e diálogo entre nós e com o público, e também uma referência para pesquisas sobre o cinema indígena feminino. Nosso trabalho aborda questões centrais dos nossos povos, como a recuperação das memórias históricas, a reafirmação das identidades étnicas, a valorização dos conhecimentos tradicionais, das línguas e do papel das mulheres nas nossas sociedades.

No evento de lançamento, no dia 29 de abril de 2023, que você pode assistir abaixo, estiveram presentes, além das coordenadoras Sophia, Mari e Helena e outras membras da equipe Natali Mamani e Vicky Mouawad, as cineastas e integrantes do Conselho, Graciela Guarani, Olinda Yawar Tupinambá (Mediação) e Vanuzia Pataxó, e as convidadas Beka Munduruku e Francy Baniwa.

Leia a entrevista, realizada por email.

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Outras Palavras – A Rede Katahirine de mulheres indígenas cineastas foi lançada no último sábado, dia 29/04. Como foi gestada a ideia da rede e quais são as primeiras ações que ela deve pôr em prática?

Sophia Pinheiro –A Rede surgiu da confluência entre o Instituto Catitu, organização que atua junto aos povos indígenas para o fortalecimento do protagonismo das mulheres por meio do uso de novas tecnologias, e a minha pesquisa de doutorado pelo PPGCine-UFF. ​​Com o mapeamento que fiz na minha tese de doutorado com coletivos, associações, realizadoras e realizadores, para conhecer o trabalho de novas cineastas indígenas, Mari Corrêa [diretora do Catitu] me convidou para fazer parte da equipe de elaboração de uma rede de mulheres indígenas cineastas. O Instituto Catitu já estava com a proposta de criação da Katahirine – Rede Audiovisual das Mulheres Indígenas, então percebemos que minha pesquisa de doutorado conversava diretamente com este projeto. Dessa forma, demos início à articulação da Rede com minha entrada na coordenação, ao lado de Mari e Helena Corezomaé, e com as outras mulheres que a compõem no Conselho.

A criação da Katahirine – Rede Audiovisual das Mulheres Indígenas vem afirmar a importância de construir uma rede política de encontros, diálogos, pesquisa e reflete a urgência de repensarmos a maneira como reproduzimos nossa educação colonial como sociedade. O racismo e o machismo estruturais no Brasil afetam nossas vidas e, apesar de serem muitas mulheres originárias que representam suas cosmovisões por meio da linguagem audiovisual, é pouco o reconhecimento que elas têm e, portanto, ínfima a valorização do seus trabalhos. Na pesquisa de doutorado, busco historicizar o cinema indígena feminino brasileiro a partir de filmes de mulheres diretoras e que também ocupam outras funções, dos anos 2000 (primeira data de que se tem conhecimento de uma direção feminina indígena) até o presente. Esse processo se deu sem colocar os filmes que elas fazem em relação ao cinema não indígena, para que ele não seja a régua do que estão produzindo – visto que suas construções dizem respeito às comunidades e a elas mesmas em relação às comunidades e suas subjetividades. Futuramente planejamos promover encontros entre as realizadoras de todo o país e organizar mostras, atuar no desenvolvimento de estratégias de fortalecimento do audiovisual indígena e na proposição de políticas públicas que atendam a produção do cinema feito pelas mulheres indígenas.

Como vocês descreveriam a especificidade do trabalho das mulheres indígenas no audiovisual? É possível identificar características que distinguem essas cineastas e seu trabalho?

Desejando superar a classificação, as categorias e sair das cercas criadas pela colonização, onde o próprio sistema define “quem a gente é e quem a gente não é” – como me disse Graciela Guarani –, os filmes realizados por mulheres indígenas “se alinham a questões relacionadas à condição feminina e ao que se chama de contracinema, que seria uma resposta feminista ao cinema tradicional”, citando Karla Holanda. Mudar e transformar pela via da percepção – por meio das cosmovisões que estão antes dos filmes, nesses filmes que acontecem junto com a vida. Essa foi a grande questão da minha tese. As imagens e os filmes das mulheres indígenas perturbam e reencantam o cinema, alargando nosso modo ver, pensar e fazer, sentindo, pensando e agindo, em um chamamento para ver com outros olhos – aquele olhar da manhã, a primeira abertura dos olhos depois de uma noite sonhando.

Ver não apenas com os olhos, mas com todo o corpo e sentimento, ver com os olhos dos pássaros, da capivara, da onça, ver como veem fungos, plantas, divindades; fazer as imagens de outro modo, em colaboração com as pessoas e outros agentes do mundo visível e invisível, encantando as imagens e o pensamento, criando teias de afeto e sonhos. Movimentando as imagens junto com a vida, porque acontecem com a vida. Esses são os cernes dosentipensamentoque as mulheres originárias nos inspiram. Considero que há uma outra perspectiva do cinema e da arte indígena contemporâneos, com ênfase ao sentipensar no seio das filosofias ameríndias: uma ciência artesanal que se tece por meio da paixão, da respiração, daquilo que compartimos em coletivo; comprometida com a vida, porque se reconhece como parte dela. O sentipensamento é uma articulação que traz o envolvimento de outras partes do corpo para a sabedoria, aspecto que alinha cabeça, coração, mãos, pés, pulmão, entranhas… E perturba o sentido racional, binário e masculino do pensamento. Uma forma de realização cinematográfica que permite fazer-com, gestar-com com outros seres: fungos, plantas, bichos e humanos. São produções que servem aos interesses das mulheres indígenas, sem pensar em circuitos de festivais ou exibição externa às aldeias.

Mesmo para quem conhece um pouco da produção indígena no audiovisual, é impressionante que essa rede seja lançada com a participação de 76 mulheres cineastas de 32 etnias. Toda essa força evidentemente não surge de uma hora para a outra, é o resultado de décadas de trabalho. Você pode contar rapidamente como se formou essa comunidade do audiovisual de mulheres indígenas?

No Brasil, a formação dessa comunidade é realizada sobretudo por Instituições não indígenas e mais recentemente outros projetos e ONGs. Especificamente a formação de mulheres cineastas é conduzida sobretudo pelo Instituto Catitu. Algumas das cineastas aprenderam a filmar sozinhas ou pelo contato com comunicadoras(es) indígenas, mas o papel das oficinas audiovisuais indígenas, realizadas pelo Instituto Catitu, é importantíssimo para essa consolidação.

Como a rede se distribui territorialmente hoje? Há maior concentração de membras em algumas regiões?

Da Rede participam mulheres de todos os biomas, de diferentes regiões e povos, temos 32 etnias e até agora, 75 mulheres cineasta indígenas mapeadas. Algumas não conseguimos contato ainda, então fazem parte da Rede e constam no site 57. Temos a seguinte distribuição das mulheres por bioma: 15 da Amazônia; 7 da Caatinga; 16 do Cerrado; 18 da Mata Atlântica; 1 do Pampa. Infelizmente não temos nenhuma mulher do Pantanal, mas estamos articulando como resolver isso. Uma das potências da Rede é justamente diagnosticar onde precisamos atuar mais em formações audiovisuais, como por exemplo Caatinga e Pampa, para que essas atuações sejam ao menos mais próximas e não invisibilizem nenhum bioma ou mulher.

Nos últimos anos, tem sido notável a presença indígena em espaços importantes, não do “mercado” cultural, mas do “sistema da cultura”, como em exposições, mostras, livros, cursos, etc. Para citar apenas um exemplo, a 34ª Bienal de São Paulo teve a participação de inúmeros/as artistas indígenas, e um notável trabalho de curadoria de Jaider Esbell. Esta Rede surge também como parte desse momento/movimento de ocupação de espaços? Que tipo de espaços a Katahirine pretende ocupar?

Acredito que sim. Como falamos, a Rede é resultado de um longo processo e de alianças de trabalho e afetivas entre indígenas e não indígenas. A Rede quer ocupar um lugar político, principalmente. Antes de querer ser cinema, os filmes indígenas no Brasil são sobretudo sociopolíticos, ações comunitárias de reconhecimento, comunicação interna, enfrentamento diante do mundo não indígena e trocas de saberes, conectados ao pensamento, primeiro, político e, partindo daí, estético e possuem “como objetivo não o filme em si mas o que ele provoca em termos de reflexão e desencadeia nesse processo”, como escreveram Nadja Marin e Paula Morgado. O cinema indígena é, então, uma armadilha de caçar. No caso, nós somos a caça. Quem vai ao cinema, esperando assistir a algo “de índio”, depara-se com filmes da terra – e nós entramos na terra e na luta por ela, enquanto somos capturadas como espectadoras –; vemos algo construído a partir de uma estratégia comunal, de uma aldeia como proposição filosófica de vida e de se fazer uns nos outros, agindo mutuamente e se complementando em seus contrastes e coisas não duras – mas moles, pois se moldam, a partir da experiência vivida.

Já no seu lançamento, a rede Katahirine declara ter o desejo de incluir cineastas de povos de outros países da América Latina. Já há conversas nesse sentido?

Vamos estruturar e debater mais nacionalmente por enquanto, mas a ideia é expandir a rede por toda América Latina em breve. A Natali Mamani, indígena Aymara e imigrante, faz parte da equipe da Rede e do Catitu e é nossa primeira participante boliviana e brasileira.

Por: https://outraspalavras.net/poeticas/o-cinema-sentipensamento-das-mulheres-indigenas/

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