O Estado de São Paulo possui a tradição de ter uma política para o Meio Ambiente, muitas vezes pioneira no Brasil. São exemplos, o Conselho Estadual de Meio Ambiente, o ICMS Ecológico, o Sistema de Recursos Hídricos, os órgãos técnicos de pesquisa, de fiscalização e de gestão.
Ultimamente este protagonismo tem sido afetado pela instabilidade na gestão, pela troca constante de secretários e dirigentes. Na atual gestão no Governo do Estado iniciada em 2015 já tivemos três secretários, seis diretores executivos da Fundação Florestal, além da substituição de diversos outros cargos importantes no setor ambiental.
Em grande parte, essas trocas não se deveram a questões de gestão ou técnica, mas a arranjos políticos partidários pontuais. A recente substituição do Secretário Mauricio Brusadin conforme noticiado é mais um desses tristes exemplos.
Pelo histórico recente, com o acúmulo de efeitos na administração do sistema, pelo curto prazo remanescente de mandato, uma nomeação política deve agravar os efeitos negativos desta situação, colocando em risco o bom desempenho da missão institucional da Secretaria de Meio Ambiente.
Assim as entidades abaixo vêm se manifestar reivindicando que a condução do Sistema Ambiental Paulista seja feita por quadros técnicos capacitados e comprometidos com a questão ambiental, de maneira a não comprometer diversos processos em andamento, como a elaboração de Planos de Manejo de Unidades de Conservação, a regulamentação do Programa de Regularização Ambiental, dentre outros.
O Conselho Diretor da Abong, reunido em São Paulo nestes dias 14 e 15 de junho, parabeniza as mulheres argentinas pela vitória histórica com a aprovação pela Câmara da descriminalização do aborto até 14 semanas de gravidez. A votação, que durou 23 horas e atravessou a madrugada de quarta para quinta-feira, foi acompanhada a cada minuto por guerreiras dos movimentos de mulheres.
Este foi apenas mais um capítulo de uma impressionante jornada de lutas e manifestações das feministas do país. O lenço verde com a frase “educação sexual para decidir, anticoncepcional para não abortar, aborto legal para não morrer” já está marcado na história das lutas das mulheres em todo o mundo.
Caso seja ratificada em votação no Senado, a Argentina se juntará ao Uruguai entre os países do Cone Sul que reconhecem o direito das mulheres à autonomia sobre seus próprios corpos. Torcemos para que o peso político da Argentina, país com uma dimensão fundamental na América Latina, seja um fator para alavancar essa discussão em todos os países.
Num momento em que o Brasil sofre ataques de forças conservadoras, que ameaçam retroceder até mesmo no direito à interrupção da gravidez nas circunstâncias em que ele já é previsto em lei, a vitória das argentinas é uma inspiração e um reforço na luta pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.
É pela vida das mulheres!
São Paulo, 15 de junho de 2018
Abong – Organizações em Defesa dos Direitos e Bens Comuns
Surpreendeu! O Fórum Social Mundial (FSM) 2018, realizado em Salvador de 13 a 17 de março 2018, mexeu com as emoções e as convicções de muita gente, de estrangeiros e brasileiros até os próprios baianos e pessoas membros do Grupo Facilitador, que conduziram a sua construção. De forma geral, o FSM 2018 agradou e empolgou. Na reunião do Conselho Internacional, que ocorreu no final do evento, nos dias 17 e 18 de março, as intervenções das pessoas presentes não dispensaram elogios, ressaltando a vivacidade do evento, a mobilização muito expressiva dos mais diversos grupos e organizações, o estímulo ao movimento altermundialista ou ainda a hospitalidade e a disposição do povo baiano. As fragilidades apontadas na organização do evento, relacionadas com o site, a programação virtual que não chegou a ser impressa ou ainda com as dificuldades para localizar tendas e salas para algumas atividades nos primeiros dias, não afetaram a relevância do encontro. Para a maioria, o Fórum saiu revigorado, e as dúvidas sobre a possibilidade do evento em Salvador ser o último do gênero, foram afastadas: o FSM renasceu.
O FSM 2018 superou as expectativas: em vez das 50 mil pessoas esperadas, reuniu cerca de 80 mil participantes – mais do dobro de FSM 2016 em Montreal, no Canadá – um público sendo majoritariamente formado por negras e negros, mulheres, povos tradicionais de matriz africana, juventudes de periferias e indígenas. Todas e todos juntos e misturados. A cultura popular sempre ocupou o ponto alto dos vários acontecimentos do FSM, deste a Marcha de Abertura, com a participação de 60 mil pessoas, passando por todos os demais momentos e encerrando com o Cortejo Cultural.
O FSM teve como espaço central o Campus da Ondina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) mas seu território se estendeu em toda cidade e região metropolitana, com um total de 70 lugares onde foram desenvolvidas atividades. O campus da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), no bairro do Cabula, abrigou o encontro de lideranças de religiões de matriz africana, com mais de 400 representantes presentes. O Território de Itapuã, na Lagoa do Abaetê, teve uma programação própria (política e cultural) e finalizou com uma virada cultural na noite de 17/03. O acampamento Intercontinental da Juventude, no Parque de Exposições, onde 2 mil pessoas acamparam, também abrigou atividades, incluindo uma assembleia mundial das juventudes e um grande show.
No estádio de Pituaçu, ocorreu no dia 15/03 uma assembleia mundial em defesa da democracia, com a presença de diversas lideranças de movimentos sociais brasileiros e internacionais, assim como de políticos de destaque, que resistem frente aos retrocessos nas instituições democráticas nacionais, a exemplo dos ex-presidentes Manuel Zellaya de Honduras e Luiz Inácio Lula da Silva.
No dia seguinte, a Assembleia Mundial das Mulheres reuniu por sua vez 8 mil mulheres, no Terreiro de Jesus, em pleno centro histórico. O assassinato de Marielle Franco no dia 14, que estava prevista para intervir em uma atividade do FSM dois dias depois, marcou profundamente o evento, com marcha, atos e inúmeras declarações. A democracia estava sangrando, porém resistindo.
A Bahia estava muito bem representada, a exemplo da participação marcante de vinte dos vinte e dois povos indígenas existentes no estado, acampados em frente à Assembleia Legislativa da Bahia. O Brasil também se fez presente com movimentos de todo país, muitos deles vindos em caravanas de ônibus organizados por comitês estaduais do FSM 2018. Foi um Fórum Social realmente Mundial, que contou com mais de 6 mil participantes internacionais, tendo a presença latino-americana e africana dentre as maiores delegações estrangeiras. Destaque para as representações de Marrocos, Alemanha, Itália e Canadá (Québec).
O grande número de participantes resultou na realização de 2 mil atividades, todas organizadas de forma autogestionada. Do ponto de vista dos conteúdos, o FSM 2018 proporcionou importantes acúmulos das agendas que circularam os eixos do desenvolvimento, justiça social e ambiental, dos direitos humanos, das mulheres e dos temas da luta contra o racismo e a xenofobia, onde houve maior número de atividades inscritas. Ecoaram as vozes das juventudes, do segmento LGBTQI, das mulheres negras, curdas e saarauis, do povo palestino, dos pescadores tradicionais, das pessoas com deficiência, das lutas urbanas, da saúde mental, entre outros. Os resultados das atividades autogestionadas e principalmente das diversas convergências temáticas realizadas foram expostos na manhã do último dia, 17/03, na Ágora dos Futuros, na Praça das Artes no campus da UFBA.
Para além da denúncia do sistema, muitas foram as atividades de trocas de experiências entre movimentos e organizações sociais que já praticam, em suas comunidades e grupos, os valores de um outro mundo possível. Por isso, o lema “Resistir é Criar, Resistir é Transformar” foi tão atual e concreto, muito mais vivido do que teorizado. A atuação da economia solidária foi particularmente significativa nesse sentido.
Talvez, por isso, aquelas pessoas acostumadas demais com os Fóruns Sociais eurocêntricos, de pele branca e atividades formais de debates teóricos sobre o futuro da esquerda no mundo tenham estranhado a vitalidade e a inovação do FSM de Salvador. O FSM 2018 foi realizado em um tempo recorde e enfrentou condições adversas, tanto do ponto de vista político quanto financeiro. Resultado de uma iniciativa do Coletivo Baiano do FSM, que apresentou a proposta de um evento de caráter mundial durante o Fórum Social das Resistências, em janeiro de 2017, em Porto Alegre, o FSM 2018 não conseguiu conquistar algumas lideranças de movimentos sociais, notadamente da região Sudeste. Mas o seu processo de construção foi altamente participativo e levou à mobilização e envolvimento dos mais diversos movimentos, povos e territórios em resistência, resultando na criação de um amplo Coletivo Brasileiro, de um Grupo Facilitador formado por 25 organizações representativos dessa pluralidade, e de múltiplos grupos de trabalho que prepararam o evento de forma autogestionada. Os principais apoios financeiros vieram do governo do estado da Bahia e da organização alemã Pão Para o Mundo (PPM).
O FSM 2018 contribuiu para aproximar as lutas de movimentos em resistência, estabelecendo relações anticapitalistas, antirracistas, antissexistas e anticoloniais. A prática mostrou que essa demolição e reconstrução de relações começa dentro da própria dinâmica do FSM e da articulação entre os movimentos.
Resta o desafio do FSM romper com a invisibilidade imposta pelo sistema capitalista através dos monopólios e oligopólios dos grandes grupos de comunicação, para alcançar uma maior incidência no imaginário coletivo e na sociedade em geral. A humanidade está em uma fase de transição, e o FSM deve continuar o seu caminho de espaço auto-gestionando, anti-neoliberal, profundamente crítico ao sistema e propositivo de alternativas. Um outro mundo segue sendo possível e necessário. E a nós cabe prosseguir lutando para construí-lo.
Damien Hazard é coordenador da Vida Brasil, diretor da Associação Brasileiro de ONGs (ABONG) na Bahia, membro do Grupo Facilitador do FSM 2018 e do Conselho Internacional do FSM
Mauri Cruz é membro do CAMP, diretor executivo da Associação Brasileira de ONGs (ABONG), membro do Grupo Facilitador do FSM 2018 e do Conselho Internacional do FSM
A deposição, sem crime de responsabilidades, de Dilma Rousseff, uma presidenta legitimamente eleita, significou uma ruptura democrática, pouco mais de três décadas após a abertura política iniciada em 1985 que pôs fim a ditadura militar. Com isso, desde abril de 2016, o Brasil tem vivido um período de profundos retrocessos democráticos, sociais e econômicos que, somados aos retrocessos ambientais que já eram evidentes no período anterior, põem toda sociedade brasileira em alerta.
Estes retrocessos se materializam com a aprovação do congelamento dos investimentos públicos em saúde, educação, previdência e seguridade social; nas ações que visam criminalizar e restringir a atuação da sociedade civil na defesa de seus direitos; nas propostas de reforma da previdência que retiram direitos sociais, em especial das mulheres; na tentativa de criminalização das lutas de defesa dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres; no estancamento da demarcação das terras indígenas; na destruição dos direitos das trabalhadoras e trabalhadores com a alteração da legislação trabalhista; no ataque às cotas raciais e sociais nas políticas públicas de educação; no crescimento de assassinatos e encarceramento da juventude negra brasileira; no acirramento das disputas por terra e território, seja no campo ou nas cidades.
Estas medidas, que representam uma afronta à democracia brasileira, estão sendo implementadas pelas elites econômicas com grande apoio das empresas da mídia corporativa, do Poder Judiciário e do Congresso Nacional – que foi sequestrado pelas grandes empresas com o financiamento empresarial nacional e internacional de suas campanhas.
Frente a esta onda conservadora, a sociedade brasileira tem estado perplexa e sem entender como, após mais de 30 anos de processo lento de avanço da democracia, iniciou-se um acelerado retrocesso democrático. A esta perplexidade soma-se uma verdadeira cortina de fumaça criada pela mídia corporativa, que diuturnamente divulga fatos de corrupção envolvendo grandes empresas e políticos de todos os matizes, criminalizando a política e os políticos. No entanto, na sua maioria, estes empresários e políticos acabam livres, respaldados por processos judiciais sob controle das mesmas elites.
Neste sentido, a condenação em tempo recorde, sem provas, em desrespeito ao devido processo legal, do ex-Presidente Lula e a decretação de sua prisão menos de 24 horas após o julgamento de um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal, sem que o acórdão tenha sido sequer publicado e tramitado os prazos legais, funcionou como um estopim de uma reação dos movimentos sociais populares e de uma comoção nacional em defesa de Lula e do que ele representa para o povo brasileiro.
Evidente está que as causas da miséria do povo brasileiro não são a falta de terras, de alimento, de água, de trabalho, de inteligência e criatividade. A miséria do povo brasileiro tem como causa a extrema concentração das riquezas nas mãos de poucas famílias e sua subserviência aos interesses do capital internacional. Daí que o simbolismo da prisão de Lula, de forma arbitrária, ilegal e ilegítima, expõe de forma cabal a divisão de classes no Brasil e exige que todas as organizações e movimentos sociais se posicionem, não simplesmente a favor de Lula e o que ele representa, mas contra o pensamento autoritário, excludente, misógino, machista, racista e antidemocrático da elite brasileira que tenta organizar e legitimar esta prisão e com isso, reorganizar um pensamento antidemocrático na sociedade brasileira. A aceitação da prisão ilegítima e ilegal de Lula será a aceitação da ilegalidade e ilegitimidade de toda e qualquer luta popular no Brasil.
Neste sentido, a Abong se soma à resistência pacífica e organizada das organizações e movimentos sociais do Brasil e do Mundo que exigem Lula Livre como símbolo da retomada da democracia no país, contra o arbítrio e a imposição de agendas antidemocráticas no país.
É preciso reconhecer que, na história do Brasil, em outros momentos agudos de enfrentamento das classes populares contra as elites e o grande capital saímos derrotados. Não foram derrotas completas porque, quem luta, sempre deixa uma semente para as futuras gerações. Mas os enfrentamentos não foram capazes de alterar a correlação de forças em favor de um projeto democrático e popular. Da mesma forma, em período favoráveis, as lideranças políticas não priorizaram o fortalecimento da organização popular. Dizemos isso, porque é fundamental que este momento de enfrentamento seja pensado também como processo de empoderamento popular, mudando as formas de relação de poder entre os partidos e organizações sociais do próprio campo popular.
Por isso, a Abong se soma a mobilização internacional em defesa de Lula e seguirá atuando para que as organizações, movimentos, redes e plataformas sociais aproveitem este momento de mobilização para constituir um ambiente de unidade com o povo brasileiro em torno das agendas estruturantes como a reforma política para a ampliação da democracia e da participação popular real e direta na discussão e decisão dos interesses coletivos e dos bens comuns; a reforma tributária que tribute a riqueza e que promova a redistribuição de renda através de politicas sociais públicas e gratuitas; a reforma do poder judiciário para que haja controle social sobre seu funcionamento; as reformas agrária e urbana para que seja democratizada a propriedade das terras e territórios brasileiros; a demarcação das terras indígenas, quilombolas e dos povos tradicionais e originários; a redução da jornada de trabalho sem redução dos salários e outras medidas capazes de impor limites e controle social sobre o grande capital e seus interesses e estabelecer a soberania popular sobre as riquezas do Brasil.
Outro Brasil é possível, urgente e necessário. E ele somente será construído com muita participação popular.
A Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong), entidade que articula centenas de instituições de defesa de direitos em todo o Brasil, vem a público externar sua apreensão com as medidas tomadas pelo Governo Federal ao decretar em 16 de fevereiro de 2018 a intervenção militar no Estado de Rio de Janeiro.
Para além de sua ineficácia, já que não enfrenta a crise de legitimidade do Estado brasileiro e fluminense e impõe mais violência estatal através de aparato militar, a medida criminaliza a própria sociedade civil ao decretar que a maioria da população do Rio de Janeiro reside em território hostil. A medida, tal como está escrita, estabelece um estado de guerra no Rio de Janeiro contra a sociedade civil.
Por isso, denunciamos para toda a comunidade internacional e para os organismos de direitos humanos que a intervenção militar aprofunda o estado de exceção inaugurado com o golpe à democracia perpetrado por parte da elite brasileira com o apoio da mídia corporativa empresarial, setores do poder judiciário e da maioria parlamentar, representante dos interesses das grandes empresas nacionais e internacionais.
Para a Abong e suas associadas, esta intervenção não tem como objetivo o enfrentamento da crise institucional e de segurança pública no Rio de Janeiro. Ela pretende legitimar o estado de exceção e o poder de polícia do Estado brasileiro contra a sociedade, justamente num momento em que cresce a insatisfação e a mobilização social contra o golpe à democracia. As vítimas desta medida serão os movimentos sociais de resistência, em especial, os movimentos de mulheres, movimentos da população negra, movimentos de juventudes, movimentos culturais e toda a população pobre das cidades fluminenses.
Apelamos para que o Congresso Nacional não aprove esta medida e que os demais poderes, Judiciário e Ministério Público venham a público condenar tal medida e exijam que o Governo Brasileiro e o Governo do Rio de Janeiro apresentem alternativas para o enfrentamento da crise.
Da mesma forma, apelamos para que as organizações da sociedade civil mundial denunciem em suas bases a injustiça dessa medida e façam pressão perante seus governos e aos organismos internacionais para que reajam publicamente.
O povo brasileiro não é criminoso. Contra a intervenção militar no Estado do Rio de Janeiro!
Somente a distribuição de renda poderá promover justiça e igualdade de direitos, base de uma sociedade democrática e pacífica.
Está no ar a sistematização do Encontro Internacional – Novos Paradigmas para Um Outro Mundo Possível. Realizado pela Abong e pelo Iser Assessoria, o evento acaonteceu durante o Fórum Social Mundial 2018, em Salvador, nos dias 14 e 15 de março.
O evento contou com duas mesas de convergência e 12 oficinas, trazendo debates diversos “cujos objetivos seriam o de mapear práticas sociais coletivas que inspiram e constroem os sentidos dos comuns e do bem viver no cotidiano; ideias e ideários alternativos ao desenvolvimento e; apontamentos para uma transição desde os modos de viver, de produzir, de consumir, de transformar a realidade”, afirma a apresentação da sistematização.
O Encontro se inseriu no âmbito do Projeto Novos Paradigmas, desenvolvido pela Abong e sua associada Iser Assessoria, em parceria com as agências internacionais, Misereor, DKA e Fastenopfer e contou com o apoio da Fundação Rosa Luxemburgo e da União Europeia.
Em novembro de 2016, a Abong realizou um encontro com comunicadores/as de algumas de suas associadas. A atividade aconteceu em São Paulo e teve como objetivo central escutar a base associativa para a tarefa de repensar sua estratégia de comunicação. O resultado deste encontro foi apresentado na reunião do Conselho Diretor da Associação, realizada em dezembro, com a finalidade de que este pudesse servir de base para a formulação de um novo plano de comunicação que priorize as demandas mais valorizadas pelas associadas e também que dialogue com o sentido estratégico da comunicação para a luta por direitos no Brasil.
A necessidade de uma comunicação pautada na estratégia política das organizações ganha ainda mais centralidade neste momento da história marcado por retrocessos em direitos conquistados nos últimos anos. E é neste momento que a voz da sociedade civil organizada pela Abong clama por mais ARTICULAÇÃO DA BASE e por mais DISPUTA DE NARRATIVAS. Estes dois eixos de ação, apontados pelas demandas mais valoradas pelas associadas durante o encontro, são duas faces que se complementam quando pensamos em disputa de sociedade, na construção de outro mundo possível.
Como fruto deste trabalho de alinhamento e fortalecimento do diálogo com sua base, a Abong implementará em 2017 um novo formato para sua comunicação. À luz do resultado do encontro de comunicação, a Associação vai reformatar sua estratégia e seus instrumentos de modo a priorizar energia e trabalho para o fortalecimento da Rede Abong e para a produção e disseminação de conteúdos com foco na disputa de narrativas na sociedade.
O que muda?
Reposicionaremos nossos instrumentos e metodologias de maneira a atender aos eixos de ação acima descritos. Desta forma, os instrumentos de comunicação da Abong (site e páginas nas redes sociais), bem como sua agenda de trabalho, passam a priorizar a produção e disseminação de conteúdos que se atenham a posicionamentos políticos sobre assuntos de interesse do campo Abong e da sociedade como um todo. Textos institucionais, de opinião e publicações mais densas (Cadernos Abong, cartilhas e materiais de apoio a processos formativos) serão o formato deste eixo de nossa comunicação.
De outro lado, o Observatório da Sociedade Civil comporá nossa estratégia sendo o veículo de comunicação da Abong mais voltado ao formato jornalístico e factual de produção, sendo ainda o olhar sobre o universo das organizações da sociedade civil. Notícias, entrevistas e conteúdos com uma dinâmica mais cotidiana sustentarão a missão do Observatório de dar visibilidade à voz e à perspectiva das organizações sobre temas de interesse do conjunto da sociedade.
Na mesma medida, o trabalho de articulação da Rede Abong – composta inicialmente por suas associadas, mas também por outras organizações de nosso campo político – se intensificará de modo a sustentar tal produção e disseminação de posicionamentos, vozes e perspectivas. Assim, a Rede Abong aspira ser sujeito ativo da comunicação que queremos difundir em larga escala para a disputa de sociedade que desejamos. Para isso, este trabalho de articulação deve ser capaz de garantir um espaço para construção de entendimentos comuns a partir da diversidade de opiniões e posições existentes, além de conquistar elementos como objetivos e agendas claras, bem como produção e ação conjuntas, de modo a potencializar nossa estratégia. Tudo isso aliado a um modo mais inovador, nos apropriando cada vez mais das novas tecnologias e instrumentos a fim de fazer uma comunicação mais atraente, eficiente e efetiva em seus objetivos.
Por fim, o direito à comunicação, abrigo de uma série de outros direitos e liberdades, também traz um grande desafio ao campo das organizações de defesa de direitos e ganhou notória valoração pelas associadas à Abong entre as iniciativas que merecem ser centralizadas neste próximo período. É tarefa da Rede Abong somar forças à luta do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC).
Queremos promover, alimentar e disseminar entre as organizações de nosso campo uma cultura de comunicação que fortaleça a institucionalidade e as causas de nossas organizações. Faremos isso juntos/as!
A Abong, em parceria com suas associadas CFEMEA, CESE e CAMP, desenvolve o Projeto Ampliar a Relevância, o Reconhecimento e o Impacto da Atuação das OSCs no Brasil, que tem como objetivo apoiar processos de organização e articulação da sociedade civil brasileira, fortalecendo seu protagonismo na afirmação de direitos e radicalização da democracia. O projeto tem apoio da União Europeia. O Projeto se insere no contexto de conflitos e mobilizações, profundas mudanças e demarcação de projetos de sociedade. É uma iniciativa possível pela coerência das propostas que as organizações defendem e apresentam, com aquelas assumidas pela União Europeia em seu plano estratégico, em especial a promoção dos direitos humanos, o reforço de capacidades das OSCs e a criação de um ambiente favorável para sua atuação.
Ações estruturantes:
Fundo de Pequenos Projetos para OSCs de base: apoio financeiro direto à experiências de defesa de direitos que se desenvolvem na base da sociedade brasileiros.
Cursos de Formação Presenciais e à Distância: fundamentais para a superação dos desafios de sustentabilidade política e financeira das OSCs de defesa de direitos. Os cursos à distância acontecem em uma plataforma própria da Abong.
Rede de Comunicadores: o projeto apoiou a criação da Cardume – Comunicação em Defesa de Direitos, uma rede de OSCs para articular as várias iniciativas de comunicação que nasceram nos últimos anos em contraposição ao monopólio da comunicação pelas empresas corporativas. A produção da Cardume alimenta o Observatório da Sociedade Civil.
Plataforma por um Novo Marco Regulatório para as OSCs: apoio para a incidência local e estadual da Plataforma na implantação e implementação da Lei 13.019/2014, que instituiu normas gerais para as relações entre as OSCs e o Poder Público nas três esferas.
O livro é resultado de dois seminários organizados pelo “Projeto Novos Paradigmas: pensar, propor, difundir”, realizado pela Abong e pelo Iser Assessoria, que reuniram especialistas, militantes e outros profissionais parceiros. Muitas foram as contribuições recolhidas desses seminários – um de 2015 e outro de 2016 -, cujos conteúdos são apresentados na publicação visando a contribuição para estimular na sociedade o debate sobre alternativas ao modelo de desenvolvimento dominante.
Trump anuncia corte histórico em políticas públicas e programas socioambientais, algo que vem se repetindo em vários países, incluindo o Brasil. E pior: a sociedade civil organizada não parece ter forças para brecar tanto retrocesso pelo mundo
Por Iara Pietricovsky, membro da Direção Executiva da Abong
A proposta encaminhada esta semana pelo presidente americano ao Congresso Nacional vai balançar as estruturas do governo federal dos Estados Unidos caso seja aprovada. Estão previstos cortes em vários programas sociais e ambientais, e na política externa, entre outros. Em termos de gastos, significa uma redução história – sem contar os cortes previstos de servidores públicos federais.
Na área de educação, a nova orientação é priorizar as escolas chamadas ¨charter schools”, que são de iniciativa privada, mas subsidiadas pelo Estado. E tal decisão foi tomada sem ouvir as populações diretamente atingidas, como as comunidades negras.
Outro desafio que os Estados Unidos têm pela frente é a implementação do Acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas, que teve pela primeira vez a assinatura do governo americano, ainda que sem a aprovação do seu Congresso Nacional. Nesta administração neoliberal e conservadora e privatizante, quase certamente o Acordo de Paris será descartado e não cumprido.
Segundo os analistas econômicos, é a primeira vez que um governo faz cortes desta magnitude nos Estados Unidos desde a Segunda Guerra Mundial.
A intenção dos cortes no orçamento americano é reduzir o papel do Estado e distribuir as responsabilidades das políticas públicas socioambientais para o setor privado e para os próprios cidadãos e cidadãs. Ninguém sabe dizer qual será o impacto final dessa medida, mas alguns já estimam um aumento no desemprego e, sem duvida, aumento da pobreza no país.
A proposta ainda será discutida no Congresso americano, e muita água vai rolar. No entanto, a capacidade de o Partido Democrata, de oposição, conseguir mudar alguma coisa na proposta de Trump é bem pequena, já que os republicanos têm maioria no Congresso. Ainda que haja uma certa reticência entre alguns republicanos sobre o sucesso da proposta de Trump, está claro que os Estados Unidos – e consequentemente o mundo – sofrerão profundas mudanças nos próximos anos.
Haja ansiedade e apreensão!
O impacto das medidas anunciadas pelo presidente Trump está sendo discutido intensamente e analisado por organizações da sociedade civil, analistas políticos e econômicos, membros do Congresso Nacional, movimentos sociais e sindicatos. No entanto, a capacidade dessas forças sociais em parar ou mesmo alterar essa investida do governo Trump parece ser nula. A loucura do novo presidente americano e seu governo parece estará bem ancorada nas instituições do país e numa parcela significativa da população que o elegeu.
É importante pensarmos o impacto dessas decisões no conjunto dos Acordos e Tratados Internacionais que vêm sendo firmados ou já assinados no âmbito da ONU. Vivemos uma crise do sistema multilateral sem precedentes. A redução da participação dos Estados Unidos nesses acordos e tratados impactará definitivamente a capacidade da ONU e sua relativa independência, tendo suas atividades cada vez mais privatizadas, resultando em redução de liberdade na tomada de decisão.
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) ficarão pendurados na liquidez e rapidez da realidade (para lembrar o filósofo e sociólogo polonês Zygmunt Bauman, recém falecido), transformando tudo sem que possamos antes refletir e atuar – como uma agenda da utopia do vir a ser. Se os ODS já não significavam mudança estrutural alguma, imagine em um mundo em crise?
Estamos muito próximos de um momento em que avanços serão uma concreta impossibilidade política.
Os Estados Unidos influenciam fortemente uma tendência conservadora no mundo. Além da própria eleição de Donald Trump como presidente do país, temos ainda o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), golpe parlamentar no Brasil e a grande ascensão de forças de direita na Holanda, França e Alemanha, que terão eleições em breve – o resultado desses pleitos dirão muito sobre o fortalecimento dessa direita extremista no curto prazo.
No mundo periférico em que o Brasil se situa, estamos reproduzindo exatamente a mesma lógica de retrocessos, ainda que com toques de cultura política específica de cada país. As elites realizam um golpe de Estado e implementam, à revelia do processo democrático, as mesmas reformas do centro do capitalismo.
A conta, claro, sobra para o povo, os 99% da população mundial. E onde está a resistência aos retrocessos? Por que, apesar de protestos aqui e ali, não tem força suficiente para brecar essa tendência conservadora e antidemocrática pelo mundo?