Declarações de Zema por união contra estados pobres provoca reações

Fala do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, reverbera negativamente na sociedade e provoca uma onda de repúdio à tese da aliança dos estados ricos contra benefícios fiscais das regiões mais pobres do país

Assinado por Evandro Éboli

No universo político, da esquerda à direita, a manifestação recente do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), permeada de preconceito regional, foi rechaçada com ênfase. Mas, ao propor uma aliança entre estados do Sul e do Sudeste — e não foi a primeira vez que surge com essa ideia —, o gestor estimulou ataques racistas e xenófobos contra o Norte e o Nordeste, um comportamento que não se controla nas redes sociais e que tem acompanhado o país, em especial, nos últimos quatro anos. Esse tipo de pensamento não é indissociável do bolsonarismo, corrente abraçada por Zema.

Outra colocação do governador, na entrevista ao Estado de S. Paulo, foi que o Brasil funciona como um “produtor rural que começa só a dar tratamento bom para as vaquinhas que produzem pouco e deixa de lado as que estão produzindo muito”, entendida como uma provocação aos nordestinos. Foram palavras, com sua força, suficientes para assanhar os mais radicais.

A insinuação de que o Nordeste pouco produz não encontra respaldo na realidade de uma região que sedia grandes empresas, tem uma forte indústria do turismo e ainda dá exemplo na exploração da energia limpa. A provocação separatista de Zema foi alvejada por outros setores da sociedade, como intelectuais, jornalistas, cientistas políticos e dirigentes de organizações não governamentais que atuam, ao contrário, na promoção de um Brasil só.

Biógrafo do paraibano Jackson do Pandeiro, o jornalista e intelectual Fernando Moura, presidente da Fundação Casa de José Américo, em João Pessoa, diz que a fala separatista de Zema não é nova e que o tema já foi alvo de um livro há quase 100 anos, no seu estado, cuja publicação foi cassada por Getúlio Vargas. Moura lembra também da canção Nordeste independente, gravada por Elba Ramalho, de autoria de Bráulio Tavares e Ivanildo Vilanova. A música, é uma resposta à tentativa separatista com tons de ironia, mas que exalta uma hipotética nação nordestina: “Dividindo a partir de Salvador/ O Nordeste seria outro país/ Vigoroso, leal, rico e feliz/ Sem dever a ninguém no exterior”, diz um dos versos da canção.

Moura não vê graça alguma na fala do governador mineiro e dá sua estocada: “Quem propõe algo dessa natureza ou é pela ignorância, galhofa, ou para dar uma roupagem estética artística, como a da música gravada por Elba. Ou por empáfia, preconceito e xenofobia. Ou mesmo por uma estratégia política suicida, que é o caso de Zema. Pensar algo assim é antipatriótico, anacrônico, preconceituoso, uma alucinação. E, se vier a ser candidato a presidente, não terá o voto do nordestino. Foi um tiro no pé. O governador não está nem no campo dos ignorantes, dos irônicos nem, muito menos, no dos poetas. Está meramente no campo da estratégia política suicida”.

“Apartheid nacional”

No entendimento dos entrevistados pelo Correio, se repete também a dedução de que Zema buscou holofote político e tenta se cacifar como herdeiro do bolsonarismo. E não só isso, como refletida na declaração de Moura. Os elementos como preconceito e ignorância cercam a fala do gestor mineiro. Diretora da Associação Nacional de Organizações Não Governamentais (Abong), a travesti baiana Keila Simpson considera que a declaração do político promove um “apartheid nacional”.

“Nos últimos quatro anos, esse discurso foi potencializado. A divisão do Brasil em dois polos. Foi o que se viu na campanha eleitoral de determinado candidato. O Nordeste sempre foi colocado em xeque por esses pensamentos de colonizadores, que pensam exatamente isso, que a Região é parte subdesenvolvida, que o Sudeste é rico e que o Norte não existe. Na boca de um gestor público reverbera, e parte da sociedade acompanha. E (o discurso) se naturaliza”, disse Simpson.

“O que ele pregou foi um apartheid nacional. Me recuso a repetir. É desconhecer a pujança do Nordeste, um centro mobilizador, industrial e polo de tanta coisa, como o turismo, uma indústria. As pessoas falam essas coisas e depois vão passear na costa marítima lá da Região. Faz sentir vergonha que um gestor faça uma provocação dessas. Uma mentalidade tacanha e reducionista, mas que, infelizmente, ganha coro de pequena parcela. Não queremos essa divisão. É algo que nem deveria estar sendo debatido”.

Os analistas políticos enxergam na declaração de Zema uma tentativa do governador em ocupar um espaço deixado por Jair Bolsonaro e obter ganhos na sua disputa interna com o governador Tarcísio Freitas (São Paulo) e até mesmo com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro. Para o cientista político André Cesar, da Hold Assessoria Legislativa, Zema de um “tiro muito forte, errado e no pé”.

“Fez algo equivocado, totalmente errado. E isso vai ter um custo, um preço. Até porque não é uma figura nacionalmente conhecida, que precisa, ao contrário, construir sua imagem. E começou muito mal. O vejo com limitações. Agora, mais ainda. Tem teto baixo”, disse ele.

“Consciência limpa”

No fim da semana passada, Zema voltou a falar sobre suas declarações e afirmou não se arrepender. “Estou com minha consciência limpa e gosto muito de trabalhar. E me parece que temos muita gente preocupada no Brasil em criar polêmica e preocupada com a próxima eleição. Estou preocupado é com realização. Estou aqui trabalhando e tem gente aí fazendo intriga.”

Matéria originalmente publicada em: https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2023/08/5116829-declaracoes-de-zema-por-uniao-contra-estados-pobres-provoca-reacoes.html

Créditos da imagem: Andrea Magnoni/Projeto Cores e Flores para Tita.

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MESA de Articulación – Declaração pública da sobre a situação política do Brasil

La “MESA de Articulación de Asociaciones Nacionales y Redes Regionales de ONG de América Latina y el Caribe” expresa su preocupación ante la situación política que se vive hoy en Brasil.

Bajo un irregular y cuestionable procedimiento judicial al ex presidente Luiz Inácio Lula Da Silva se le dictó condena y negó el “habeas corpus” llevándolo a prisión, arriesgando 12 años de cárcel.

El Comandante en Jefe del Ejército brasileño, Eduardo Villas Boas, señaló que compartía “el anhelo de todos los ciudadanos de bien, de repudio a la impunidad y respeto a la Constitución”, mientras que el general en retiro, Luiz Gonzaga Schroeder, indicó que “si el líder del PT se presentaba a las elecciones presidenciales, el único recurso era la reacción armada”.

En medio de esta contingencia política, la MESA:

1-. Condena ambas declaraciones por considerar que representan una clara intromisión a la autonomía de las instituciones del Estado.

2-. Rechaza la utilización de las instituciones de justicia como un arma persecutoria.

3-. Se une a la denuncia de la actuación de poderes fácticos y del actual gobierno ilegítimo, que actúan de espalda a la ciudadanía, cuya permanencia no hace más que consolidar la oleada neoliberal que revierte los pasos dados en materia de igualdad y justicia social, un modelo nefasto para los pueblos que arrasa con las garantías básicas y la violación de sus derechos fundamentales.

4.- Se preocupa por esta situación, ya que estos poderes buscan evitar a toda costa que fuerzas democráticas levanten una candidatura con alto apoyo ciudadano de cara a las elecciones presidenciales del próximo mes de octubre, situación que genera un clima de inseguridad a nivel nacional y regional.

5.- Expresa su solidaridad tanto al ex presidente, como a las fuerzas sociales y políticas progresistas en Brasil y en toda Latinoamérica y el Caribe.

6-. Reitera su preocupación ante los asesinatos de Marielle Franco, Alexandre Pereira y diversos Defensores de Derechos Humanos amenazados por la militarización que se vive en Brasil y otros países de la región.

7.- Confía que el pueblo brasileño restablezca su senda democrática y  acompaña sentidamente su lucha y reafirma su compromiso irrestricto con la democracia, el correcto funcionamiento de las instituciones, la justicia y el respecto a los Derechos Humanos.

Viernes 13 de abril de 2018.

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