A Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais no Estado de
Pernambuco (ABONG PE) e suas filiadas vêm, por meio desta nota, manifestar sua posição
em defesa da democracia, dos direitos humanos, da justiça socioambiental e do
desenvolvimento sustentável. Reconhecemos os povos originários, em especial os povos
indígenas e quilombolas, como guardiãs das florestas e do território brasileiro, e defendemos
seus direitos e sua participação ativa na tomada de decisões que afetam suas vidas e seus
territórios.
Repudiamos veementemente os retrocessos que o povo brasileiro tem sofrido,
resultantes de uma política de retirada de direitos, liderada pelas bancadas conservadoras do
Congresso Nacional, que representam as elites do agronegócio. Essa agenda de retrocesso
ameaça a democracia e a soberania do Estado brasileiro, comprometendo os avanços
conquistados ao longo de décadas de lutas e mobilizações populares que vem causando os
impactos naturais responsáveis pelas mudanças climáticas.
É preciso ter ciência que as decisões políticas propostas pela Medida Provisória 1154
e o Projeto de Lei 490 restringem o direito à terra e ameaçam a existência dos povos
indígenas brasileiros que, a duras penas, lutam diariamente para sobreviver ao genocídio e o
epstemicídio (que já duram mais de 500 anos). Tais medidas retiram atribuições dos
Ministérios dos Povos Indígenas e do Meio Ambiente, colocando em risco a preservação
ambiental e a garantia dos direitos dos povos indígenas, que já enfrentam inúmeras
dificuldades para manter suas terras e seus modos de vida.
Nesse contexto, é fundamental ressaltar a importância da resistência e do apoio das
organizações da sociedade civil na defesa dos povos originários. Convocamos a sociedade em
geral a se unir à causa e à luta da população indígena e seus territórios. Entendemos que a
solidariedade e a mobilização são essenciais para enfrentar os desafios e barrar as ameaças
que colocam em risco a cultura e a existência desse povo.
A ABONG PE reafirma seu compromisso em defender os direitos humanos, a justiça
socioambiental e a sustentabilidade, em consonância com os princípios da democracia.
Somente com a união de todas, todos/es, seremos capazes de garantir a proteção dos povos
indígenas e a preservação do meio ambiente, construindo um futuro mais justo e igualitário
para todas as pessoas que vivem sob este céu e compartilham desta terra.
Neste momento, o silêncio não é uma opção para a sociedade civil!!! Repudiamos a
MP N°1.154 e o Projeto de Lei N°490
Especialista em Indicadores Sociais, diretora do Ibase e membro da coordenação executiva daPlataforma Dhesca
A convite do Estado Brasileiro, a subsecretária-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e assessora especial sobre prevenção ao genocídio, Alice Wairimu Nderitu, esteve em visita ao país no período de 1 a 12 de maio. Com uma agenda extensa, Alice conversou com representantes de diversos ministérios – como Igualdade Racial, Direitos Humanos e Cidadania, Povos Indígenas, Mulheres, Esporte, Saúde e Justiça e Segurança Pública – além da Defensoria Pública da União, Procuradoria Geral da República, Advocacia Geral da União e integrantes de governos estaduais incluídos na missão. Encontrou-se ainda com lideranças de favelas e periferias, no Rio de Janeiro, e de comunidades indígenas Yanomami e, em Roraima, e do povo Guarani-Kaiowá, em Mato Grosso do Sul.
É de suma importância considerar que todas as pessoas que se dispuseram a estar conosco naquela tarde – especialmente os(as) diretamente atingidos(as) por abusos e violência policial – acreditaram que as entidades organizadoras proporcionariam um ambiente de confiança e segurança para exporem suas vidas e dores mais profundas. Alguns dos presentes ao encontro e seus familiares convivem com ameaças às suas vidas simplesmente por buscarem justiça e reparação. Os depoimentos, todos muito fortes, que ouvimos naquela tarde foram imprescindíveis para caracterizar os fatores de risco de crimes de genocídio.
Este é um porto a ser reforçado: Alice é assessora especial da ONU sobre prevenção ao genocídio e, como reiterou algumas vezes em nossas conversas, a visita não tratava de determinar se o crime de genocídio foi cometido ou não. Tal tarefa cabe aos tribunais internacionais. O que a subsecretária da ONU buscava era analisar a presença de situações de risco para ampliar a possibilidade de proteção aos grupos vulneráveis presentes que expunham as situações concretas vividas. Entender essa lógica é absolutamente fundamental para o correto enfrentamento da grave situação que vivemos, reconhecendo aliados e agindo nas esferas próprias para cada etapa.
Em sua declaração oficial após a visita, Alice Wairimu Nderitu aponta que há registros de graves violações do direito internacional dos direitos humanos contra grupos vulneráveis, destacando a presença do uso excessivo da força pelas agências de segurança nas ações violentas da polícia contra pessoas negras a pretexto de combater a criminalidade nas comunidades onde vivem e que a responsabilização pela morte de pessoas afrodescendentes é quase inexistente no Brasil. O documento também considera que a presença desses fatores de risco para crimes de atrocidade exige medidas urgentes por parte das autoridades, da sociedade civil, da mídia, das Nações Unidas e de outros atores relevantes para corrigir essa trajetória.
Dentre as recomendações feitas por Alice, destaco os trechos “o Brasil é signatário da Convenção de Genocídio e de outros tratados de direitos humanos, deve combater a impunidade, principalmente entre as forças de segurança que cometeram graves violações contra indígenas e afrodescendentes brasileiros” e “o Governo deveria examinar as atuais políticas de combate ao crime (drogas), que têm impactado fortemente a população negra e investigar vigorosamente todos os incidentes de assassinato e execuções extrajudiciais. Por exemplo, mortes em mãos de policiais classificadas como atos de resistência à prisão devem ser integralmente investigadas por órgãos independentes”. Há ainda o reconhecimento do papel inestimável que representantes dos meios de comunicação têm na educação, informação, sensibilização e alerta sobre situações de risco de genocídio e crimes atrozes relacionados, contrapondo as narrativas de ódio e segregação com fatos verificados.
A íntegra das recomendações de Alice Wairimu Nderitu pode ser acessadaaqui.
Recém-lançada, a Rede Katahirine – ‘constelação’ de realizadoras – articulará espaços políticos. “O cinema indígena é uma armadilha de caçar: no caso, nós somos a caça”, explica coordenadora, mostrando como telas se tornam campos de luta.
Publicado 05/05/2023 às 20:12 – Atualizado 06/05/2023 às 21:33
PorSophia Pinheiro, entrevistada porMaurício Ayer
“Ver não apenas com os olhos, mas com todo o corpo e sentimento, ver com os olhos dos pássaros, da capivara, da onça, ver como veem fungos, plantas, divindades; fazer as imagens de outro modo, em colaboração com as pessoas e outros agentes do mundo visível e invisível, encantando as imagens e o pensamento, criando teias de afeto e sonhos.” Assim Sophia Pinheiro descreve o modo como essas mulheres dão luz aos seus olhares em um cinema que certamente terá agora um espaço próprio para se pensar e conquistar espaço político e cultural na sociedade brasileira.
Juntamente com Mari Corrêa e Helena Corezomaé, Sophia coordena daRede Katahirine, lançada no último sábado em evento virtual (como noticiou Outras Palavras), congregando 76 mulheres indígenas cineastas. A rede foi concebida pelo Instituto Catitu, dirigido por Mari, como resultado de muitos anos de trabalho em oficinas de audiovisual com mulheres originárias, e se materializou com a articulação das coordenadoras, conselheiras e outras dezenas de realizadoras.
Nesta entrevista com Sophia, conhecemos como essa rede se formou e o que ela pretende. “Antes de querer ser cinema, os filmes indígenas no Brasil são sobretudo sociopolíticos, ações comunitárias de reconhecimento, comunicação interna, enfrentamento diante do mundo não indígena e trocas de saberes, conectados ao pensamento, primeiro, político e, partindo daí, estético”, explica. Esse modo de fazer filmes tem ressonância nos próprios objetivos da Rede. Conforme escreveu o Conselho:
Acreditamos que a rede poderá ser uma importante ferramenta de conhecimento e diálogo entre nós e com o público, e também uma referência para pesquisas sobre o cinema indígena feminino. Nosso trabalho aborda questões centrais dos nossos povos, como a recuperação das memórias históricas, a reafirmação das identidades étnicas, a valorização dos conhecimentos tradicionais, das línguas e do papel das mulheres nas nossas sociedades.
No evento de lançamento, no dia 29 de abril de 2023, que você pode assistir abaixo, estiveram presentes, além das coordenadoras Sophia, Mari e Helena e outras membras da equipe Natali Mamani e Vicky Mouawad, as cineastas e integrantes do Conselho, Graciela Guarani, Olinda Yawar Tupinambá (Mediação) e Vanuzia Pataxó, e as convidadas Beka Munduruku e Francy Baniwa.
Leia a entrevista, realizada por email.
______________
Outras Palavras – A Rede Katahirine de mulheres indígenas cineastas foi lançada no último sábado, dia 29/04. Como foi gestada a ideia da rede e quais são as primeiras ações que ela deve pôr em prática?
Sophia Pinheiro –A Rede surgiu da confluência entre o Instituto Catitu, organização que atua junto aos povos indígenas para o fortalecimento do protagonismo das mulheres por meio do uso de novas tecnologias, e a minha pesquisa de doutorado pelo PPGCine-UFF. Com o mapeamento que fiz na minha tese de doutorado com coletivos, associações, realizadoras e realizadores, para conhecer o trabalho de novas cineastas indígenas, Mari Corrêa [diretora do Catitu] me convidou para fazer parte da equipe de elaboração de uma rede de mulheres indígenas cineastas. O Instituto Catitu já estava com a proposta de criação da Katahirine – Rede Audiovisual das Mulheres Indígenas, então percebemos que minha pesquisa de doutorado conversava diretamente com este projeto. Dessa forma, demos início à articulação da Rede com minha entrada na coordenação, ao lado de Mari e Helena Corezomaé, e com as outras mulheres que a compõem no Conselho.
A criação da Katahirine – Rede Audiovisual das Mulheres Indígenas vem afirmar a importância de construir uma rede política de encontros, diálogos, pesquisa e reflete a urgência de repensarmos a maneira como reproduzimos nossa educação colonial como sociedade. O racismo e o machismo estruturais no Brasil afetam nossas vidas e, apesar de serem muitas mulheres originárias que representam suas cosmovisões por meio da linguagem audiovisual, é pouco o reconhecimento que elas têm e, portanto, ínfima a valorização do seus trabalhos. Na pesquisa de doutorado, busco historicizar o cinema indígena feminino brasileiro a partir de filmes de mulheres diretoras e que também ocupam outras funções, dos anos 2000 (primeira data de que se tem conhecimento de uma direção feminina indígena) até o presente. Esse processo se deu sem colocar os filmes que elas fazem em relação ao cinema não indígena, para que ele não seja a régua do que estão produzindo – visto que suas construções dizem respeito às comunidades e a elas mesmas em relação às comunidades e suas subjetividades. Futuramente planejamos promover encontros entre as realizadoras de todo o país e organizar mostras, atuar no desenvolvimento de estratégias de fortalecimento do audiovisual indígena e na proposição de políticas públicas que atendam a produção do cinema feito pelas mulheres indígenas.
Como vocês descreveriam a especificidade do trabalho das mulheres indígenas no audiovisual? É possível identificar características que distinguem essas cineastas e seu trabalho?
Desejando superar a classificação, as categorias e sair das cercas criadas pela colonização, onde o próprio sistema define “quem a gente é e quem a gente não é” – como me disse Graciela Guarani –, os filmes realizados por mulheres indígenas “se alinham a questões relacionadas à condição feminina e ao que se chama de contracinema, que seria uma resposta feminista ao cinema tradicional”, citando Karla Holanda. Mudar e transformar pela via da percepção – por meio das cosmovisões que estão antes dos filmes, nesses filmes que acontecem junto com a vida. Essa foi a grande questão da minha tese. As imagens e os filmes das mulheres indígenas perturbam e reencantam o cinema, alargando nosso modo ver, pensar e fazer, sentindo, pensando e agindo, em um chamamento para ver com outros olhos – aquele olhar da manhã, a primeira abertura dos olhos depois de uma noite sonhando.
Ver não apenas com os olhos, mas com todo o corpo e sentimento, ver com os olhos dos pássaros, da capivara, da onça, ver como veem fungos, plantas, divindades; fazer as imagens de outro modo, em colaboração com as pessoas e outros agentes do mundo visível e invisível, encantando as imagens e o pensamento, criando teias de afeto e sonhos. Movimentando as imagens junto com a vida, porque acontecem com a vida. Esses são os cernes dosentipensamentoque as mulheres originárias nos inspiram. Considero que há uma outra perspectiva do cinema e da arte indígena contemporâneos, com ênfase ao sentipensar no seio das filosofias ameríndias: uma ciência artesanal que se tece por meio da paixão, da respiração, daquilo que compartimos em coletivo; comprometida com a vida, porque se reconhece como parte dela. O sentipensamento é uma articulação que traz o envolvimento de outras partes do corpo para a sabedoria, aspecto que alinha cabeça, coração, mãos, pés, pulmão, entranhas… E perturba o sentido racional, binário e masculino do pensamento. Uma forma de realização cinematográfica que permite fazer-com, gestar-com com outros seres: fungos, plantas, bichos e humanos. São produções que servem aos interesses das mulheres indígenas, sem pensar em circuitos de festivais ou exibição externa às aldeias.
Mesmo para quem conhece um pouco da produção indígena no audiovisual, é impressionante que essa rede seja lançada com a participação de 76 mulheres cineastas de 32 etnias. Toda essa força evidentemente não surge de uma hora para a outra, é o resultado de décadas de trabalho. Você pode contar rapidamente como se formou essa comunidade do audiovisual de mulheres indígenas?
No Brasil, a formação dessa comunidade é realizada sobretudo por Instituições não indígenas e mais recentemente outros projetos e ONGs. Especificamente a formação de mulheres cineastas é conduzida sobretudo pelo Instituto Catitu. Algumas das cineastas aprenderam a filmar sozinhas ou pelo contato com comunicadoras(es) indígenas, mas o papel das oficinas audiovisuais indígenas, realizadas pelo Instituto Catitu, é importantíssimo para essa consolidação.
Como a rede se distribui territorialmente hoje? Há maior concentração de membras em algumas regiões?
Da Rede participam mulheres de todos os biomas, de diferentes regiões e povos, temos 32 etnias e até agora, 75 mulheres cineasta indígenas mapeadas. Algumas não conseguimos contato ainda, então fazem parte da Rede e constam no site 57. Temos a seguinte distribuição das mulheres por bioma: 15 da Amazônia; 7 da Caatinga; 16 do Cerrado; 18 da Mata Atlântica; 1 do Pampa. Infelizmente não temos nenhuma mulher do Pantanal, mas estamos articulando como resolver isso. Uma das potências da Rede é justamente diagnosticar onde precisamos atuar mais em formações audiovisuais, como por exemplo Caatinga e Pampa, para que essas atuações sejam ao menos mais próximas e não invisibilizem nenhum bioma ou mulher.
Nos últimos anos, tem sido notável a presença indígena em espaços importantes, não do “mercado” cultural, mas do “sistema da cultura”, como em exposições, mostras, livros, cursos, etc. Para citar apenas um exemplo, a 34ª Bienal de São Paulo teve a participação de inúmeros/as artistas indígenas, e um notável trabalho de curadoria de Jaider Esbell. Esta Rede surge também como parte desse momento/movimento de ocupação de espaços? Que tipo de espaços a Katahirine pretende ocupar?
Acredito que sim. Como falamos, a Rede é resultado de um longo processo e de alianças de trabalho e afetivas entre indígenas e não indígenas. A Rede quer ocupar um lugar político, principalmente. Antes de querer ser cinema, os filmes indígenas no Brasil são sobretudo sociopolíticos, ações comunitárias de reconhecimento, comunicação interna, enfrentamento diante do mundo não indígena e trocas de saberes, conectados ao pensamento, primeiro, político e, partindo daí, estético e possuem “como objetivo não o filme em si mas o que ele provoca em termos de reflexão e desencadeia nesse processo”, como escreveram Nadja Marin e Paula Morgado. O cinema indígena é, então, uma armadilha de caçar. No caso, nós somos a caça. Quem vai ao cinema, esperando assistir a algo “de índio”, depara-se com filmes da terra – e nós entramos na terra e na luta por ela, enquanto somos capturadas como espectadoras –; vemos algo construído a partir de uma estratégia comunal, de uma aldeia como proposição filosófica de vida e de se fazer uns nos outros, agindo mutuamente e se complementando em seus contrastes e coisas não duras – mas moles, pois se moldam, a partir da experiência vivida.
Já no seu lançamento, a rede Katahirine declara ter o desejo de incluir cineastas de povos de outros países da América Latina. Já há conversas nesse sentido?
Vamos estruturar e debater mais nacionalmente por enquanto, mas a ideia é expandir a rede por toda América Latina em breve. A Natali Mamani, indígena Aymara e imigrante, faz parte da equipe da Rede e do Catitu e é nossa primeira participante boliviana e brasileira.
Mulheres indígenas da Amazônia e Cerrado serão apoiadas por projeto que pretende fortalecer a garantia dos seus direitos e seus povos. O projeto “Patak Maymu: Autonomia e participação dasmulheres indígenas da Amazônia e do Cerrado na defesa de seus direitos” é uma iniciativa da CESE — Coordenadoria Ecumênica de Serviço, com apoio e financiamento da União Europeia
Mulheres indígenas da Amazônia e Cerrado serão apoiadas por projeto que pretende fortalecer a garantia dos seus direitos e seus povos. O projeto“Patak Maymu: Autonomia e participação dasmulheres indígenas da Amazônia e do Cerrado na defesa de seus direitos” é uma iniciativa da CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço, com apoio e financiamento daUnião Europeia,
Lançado na última quinta-feira, 27, durante a programação do Acampamento Terra Livre, na tenda da Coiab – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, o ato contou com a participação de mulheres indígenas da Amazônia e Cerrado.
O projeto vai incentivar o protagonismo de mulheres indígenas e de suas organizações, contribuindo para que elas sejam reconhecidas dentro e fora de suas comunidades, pelo movimento indígena e pela sociedade brasileira. Presentes no lançamento: a diretora executiva da Cese, Sonia Mota, a gestora do projeto no Setor de Cooperação da União Europeia no Brasil (@uenobrasil) Ana Almeida; Marciely Ayap Tupari, da @coiabamazonia; Diolina Krikati; Maria Helena Gavião ( @umiabamazonia); Creuza Kadiwéu/MT; Maria Assunta Pedrosa, da Coiab; Anarrory Takina e Osmarina Muriman Takina (@takinamulheresindigenasmt ), além de Ana Paula Ferreira, assessora de projetos e formação da Cese, que apresentou a Chamada Pública de Pequenos Projetos, também lançada na data. O ato contou com o canto de Diolina Krikati, das Suraras do Tapajós e de Beatriz Tuxá, cantora e comunicadora da Cese. Stefan Agne, Chefe de Cooperação de União Europeia no Brasil, também visitou a tenda da Coiab na data.
A iniciativa será direcionada para 11 estados da Amazônia Legal e Cerrado: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Maranhão, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais. O projeto conta com a parceria da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB, União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira – UMIAB , Takiná -Organização de Mulheres Indígenas de Mato Grosso, Mulheres Indígenas Xakriabá, e Guarani kaiowá e Fundo Indígena da Amazônia Brasileira – Podáali.
No lançamento, a representante da União Europeia, Ana Almeida, (foto abaixo) destacou a importância da parceria para o fortalecimento das mulheres indígenas. “É muito importante [apoiar esse projeto para mulheres indígenas] porque fortalece as organizações das mulheres indígenas, fortalece as capacidades de gestão, a comunicação e a capacidade de articulação também. E esse trabalho não começa com esse projeto e a gente vê o resultado aqui, com uma grande participação das mulheres aqui no próprio ATL. A União Europeia defende os direitos humanos e o estado democrático de direito, são valores que compartilhamos. Uma das prioridades da União Europeia no Brasil são os povos indígenas, defensores e defensoras dos direitos humanos.’’
“O projeto traz a oportunidade para as mulheres indígenas participarem das mobilizações. A gente sabe que os apoios são muito difíceis, então esse projeto veio exatamente para apoiar mais ainda as mulheres a estarem nessas mobilizações”, ressaltou Marciely Ayap Tupari, de Rondônia, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB).
O projetoPatak Maymuterá duração de 36 meses e apoiará cerca de 60 iniciativas. Nesse período, acontecerão atividades de formação, comunicação e apoio a projetos, buscando contemplar a diversidade das mulheres indígenas e organizações mistas, incluindo a juventude indígena no contexto urbano. A expectativa é queo projetoalcance mais de 3 mil mulheres indígenas com o desenvolvimento das ações.
Na data, foi lançada a Chamada Pública de apoio a pequenos projetospara participação de mulheres indígenas da Amazônia e do Cerrado na3ª Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, que acontecerá em Brasília, em setembro.
Inscrições
As inscrições para a Chamada Pública iniciam nesta terça-feira (2) e vão até o dia 16 de junho. Serão selecionados pelo menos 20 projetos de até R$ 25 mil reais.
Para a diretora executiva da CESE, Sônia Mota, a novidade do projeto é ser direcionado não só para os estados da Amazônia, mas também para o Cerrado. “Pra gente é muito importante fazer essa conexão entre a Amazônia e o Cerrado, que são duas regiões onde o movimento indígena e o movimento de mulheres têm sofrido mais violação de direitos. Então esse nosso projeto realmente é para apoiar essas organizações nas suas lutas por protagonismo, nas suas pautas políticas, nas suas incidências por políticas públicas”, destacou durante o lançamento.
Ao longo dos 50 anos de história da CESE foram mais de 600 projetos somente no recorte da Amazônia. “A nossa vinculação com a pauta indígena é histórica. E o mais importante é que a CESE, embora seja uma organização ecumênica formada por igrejas cristãs, no momento em que a gente ouve falar dos fundamentalismos religiosos que têm adentrado nos territórios indígenas para negar sua fé, ter uma organização como a CESE que é formada por igrejas cristãs fazendo o movimento contrário, há tantos anos fortalecendo os movimentos indígenas nas suas pautas, nas suas religiosidades e isso também é o diferencial da gente”, observa Sônia Mota.
A chamada com orientações para a inscrição de iniciativas estádisponível no link.
Sobre a CESE
Com sede em Salvador (BA), CESE foi fundada em 1973 e é composta por igrejas cristãs. Há 50 anos, a organização tem como compromisso fortalecer a participação das organizações da sociedade civil, especialmente as populares, nas lutas por transformações políticas, econômicas, ambientais e sociais, focando estruturas em que prevaleça a democracia com justiça, intermediando recursos financeiros e compartilhando espaços de diálogo e articulação.
O movimento indígena tem sido uma força política fundamental produzindo mobilização social para defesa de direitos, proteção ambiental e enfrentamento a retrocessos democráticos no Brasil. Ao longo dos seus 50 anos, a CESE sempre se manteve ao lado dos povos indígenas.
Historicamente, os apoios vão desde os grupos locais às instâncias regionais, mobilizações, campanhas, dar visibilidade internacional às suas lutas através das missões ecumênicas, formações diversas, capacitações em prestação de conta, planejamento, apoio jurídico para regularização de associações, sobre gestão, comunicação, entre outras.
Serviço
Inscrições abertas para aChamada Pública de Apoio a Pequenos Projetos– apoio à participação de mulheres indígenas da Amazônia e do Cerrado na III Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, a ser realizada em Brasília.
Foilançadano último dia 13 de abril, durante o12º Congresso GIFE, a “Conjunta”, uma plataforma digital que realiza curadoria de boas práticas para organizações da sociedade civil. O projeto é fruto de uma colaboração doInstituto ACP,Instituto humanizee doGIFE, em parceria com outras 25 instituições do terceiro setor.
A iniciativa estrutura conteúdos, ferramentas, boas práticas em gestão e constrói pontes entre institutos e fundações para fortalecer suas atividades. Entre os recursos utilizados pela plataforma estão cursos, relatórios, podcast, vídeos e guias e-book. O propósito é estimular a ação colaborativa e criar soluções para o setor.
“Sempre esteve no cerne do que é o GIFE qualificar as organizações. O grupo entende que os associados têm limitações de conhecimento e a Conjunta é uma forma de suprir essas lacunas”, afirmou o Secretário-geral do grupo, Cassio França. A plataforma já conta com mais de 200 conteúdos e pode ser acessadaaqui.
Atuação colaborativa
A atuação desempenhada pelas organizações da sociedade civil (OSCs) conta com inúmeros atores que trabalham de forma colaborativa para reduzir desigualdades e promover justiça socioambiental. As pautas são cada vez mais urgentes: fome, pobreza, violência, educação, saúde, habitação, trabalho digno, questões de gênero, raciais, desmatamento. Assim, o cofundador e presidente do conselho do Instituto ACP, Rodrigo Pipponzi, defende que é necessário desenvolver o campo com olhar para ofortalecimento institucional.
“Sabemos a importância do terceiro setor dentro do contexto brasileiro e o setor fortalecido ajudará a promover um Brasil mais justo. Precisamos de recursos, conhecimento e a plataforma serve como um vetor disso”, acrescenta.
Para organizar e disseminar as práticas mapeadas, a Conjunta criou editorias como Comunicação, Gestão Financeira, Desenvolvimento Institucional, Gestão e Desenvolvimento de Pessoas, Captação de Recursos, Monitoramento e Avaliação, Planejamento, Gestão Jurídica, Governança e Inclusão e Diversidade.
“Organizações resilientes, que trabalham em rede, são essenciais para pautar transformações sociais sistêmicas e efetivas. Por isso, há uma aposta no desenvolvimento institucional de OSCs para contribuir com uma sociedade civil mais potente e transformadora. A Conjunta é um exemplo desta crença”, destaca Michele Rocha, Gerente de Operações e Desenvolvimento de OSCs do Instituto Humanize.
A gerente elogia ainda o caráter colaborativo do projeto, “que reúne esforços e perspectivas de diferentes atores e busca otimizar os recursos disponíveis no campo”.
Fortalecimento do sistema democrático
Especialmentedesde a redemocratização do país, as OSCs têm se mostrado vitais para o fortalecimento dos princípios democráticos, já que possibilitam a participação social. Uma das habilidades das OSCs, ressaltada por Rodrigo Pipponzi, é a capacidade de realizar parcerias, seja com o poder público ou com a iniciativa privada, para promover agendas fundamentais para a democracia.
“Há exemplos de organizações que trabalham pela transparência de dados, pela segurança pública, pela justiça social, contra o desmatamento. O terceiro setor preserva os direitos humanos através de sua missão e conecta atores para garantir isso.”
Com o início do novo governo, as expectativas para os próximos anos é que as organizações da sociedade civil tenham mais protagonismo e relevância na construção de políticas públicas.
“Nos últimos anos, vivenciamos um aprofundamento das desigualdades e vimos nossa democracia constantemente em risco. Hoje, há uma expectativa de fortalecimento da democracia brasileira, tanto do ponto de vista de seu sistema político e eleitoral, como da promoção da agenda de direitos. Em ambos os casos, as organizações da sociedade civil terão um papel fundamental”, defende Cássio França.
Recém-lançada, a Rede Katahirine – ‘constelação’ de realizadoras – articulará espaços políticos. “O cinema indígena é uma armadilha de caçar: no caso, nós somos a caça”, explica coordenadora, mostrando como telas se tornam campos de luta
Realizadoras indígenas. Foto obtida na página do Instituto Catitu
Por Sophia Pinheiro, entrevistada por Maurício Ayer
“Ver não apenas com os olhos, mas com todo o corpo e sentimento, ver com os olhos dos pássaros, da capivara, da onça, ver como veem fungos, plantas, divindades; fazer as imagens de outro modo, em colaboração com as pessoas e outros agentes do mundo visível e invisível, encantando as imagens e o pensamento, criando teias de afeto e sonhos.” Assim Sophia Pinheiro descreve o modo como essas mulheres dão luz aos seus olhares em um cinema que certamente terá agora um espaço próprio para se pensar e conquistar espaço político e cultural na sociedade brasileira.
Juntamente com Mari Corrêa e Helena Corezomaé, Sophia coordena da Rede Katahirine, lançada no último sábado em evento virtual (como noticiou Outras Palavras), congregando 76 mulheres indígenas cineastas. A rede foi concebida pelo Instituto Catitu, dirigido por Mari, como resultado de muitos anos de trabalho em oficinas de audiovisual com mulheres originárias, e se materializou com a articulação das coordenadoras, conselheiras e outras dezenas de realizadoras.
Acreditamos que a rede poderá ser uma importante ferramenta de conhecimento e diálogo entre nós e com o público, e também uma referência para pesquisas sobre o cinema indígena feminino. Nosso trabalho aborda questões centrais dos nossos povos, como a recuperação das memórias históricas, a reafirmação das identidades étnicas, a valorização dos conhecimentos tradicionais, das línguas e do papel das mulheres nas nossas sociedades.
No evento de lançamento, no dia 29 de abril de 2023, que você pode assistir abaixo, estiveram presentes, além das coordenadoras Sophia, Mari e Helena e outras membras da equipe Natali Mamani e Vicky Mouawad, as cineastas e integrantes do Conselho, Graciela Guarani, Olinda Yawar Tupinambá (Mediação) e Vanuzia Pataxó, e as convidadas Beka Munduruku e Francy Baniwa.
Leia a entrevista, realizada por email.
______________
Outras Palavras – A Rede Katahirine de mulheres indígenas cineastas foi lançada no último sábado, dia 29/04. Como foi gestada a ideia da rede e quais são as primeiras ações que ela deve pôr em prática?
Sophia Pinheiro – A Rede surgiu da confluência entre o Instituto Catitu, organização que atua junto aos povos indígenas para o fortalecimento do protagonismo das mulheres por meio do uso de novas tecnologias, e a minha pesquisa de doutorado pelo PPGCine-UFF. Com o mapeamento que fiz na minha tese de doutorado com coletivos, associações, realizadoras e realizadores, para conhecer o trabalho de novas cineastas indígenas, Mari Corrêa [diretora do Catitu] me convidou para fazer parte da equipe de elaboração de uma rede de mulheres indígenas cineastas. O Instituto Catitu já estava com a proposta de criação da Katahirine – Rede Audiovisual das Mulheres Indígenas, então percebemos que minha pesquisa de doutorado conversava diretamente com este projeto. Dessa forma, demos início à articulação da Rede com minha entrada na coordenação, ao lado de Mari e Helena Corezomaé, e com as outras mulheres que a compõem no Conselho.
A criação da Katahirine – Rede Audiovisual das Mulheres Indígenas vem afirmar a importância de construir uma rede política de encontros, diálogos, pesquisa e reflete a urgência de repensarmos a maneira como reproduzimos nossa educação colonial como sociedade. O racismo e o machismo estruturais no Brasil afetam nossas vidas e, apesar de serem muitas mulheres originárias que representam suas cosmovisões por meio da linguagem audiovisual, é pouco o reconhecimento que elas têm e, portanto, ínfima a valorização do seus trabalhos. Na pesquisa de doutorado, busco historicizar o cinema indígena feminino brasileiro a partir de filmes de mulheres diretoras e que também ocupam outras funções, dos anos 2000 (primeira data de que se tem conhecimento de uma direção feminina indígena) até o presente. Esse processo se deu sem colocar os filmes que elas fazem em relação ao cinema não indígena, para que ele não seja a régua do que estão produzindo – visto que suas construções dizem respeito às comunidades e a elas mesmas em relação às comunidades e suas subjetividades. Futuramente planejamos promover encontros entre as realizadoras de todo o país e organizar mostras, atuar no desenvolvimento de estratégias de fortalecimento do audiovisual indígena e na proposição de políticas públicas que atendam a produção do cinema feito pelas mulheres indígenas.
Como vocês descreveriam a especificidade do trabalho das mulheres indígenas no audiovisual? É possível identificar características que distinguem essas cineastas e seu trabalho?
Desejando superar a classificação, as categorias e sair das cercas criadas pela colonização, onde o próprio sistema define “quem a gente é e quem a gente não é” – como me disse Graciela Guarani –, os filmes realizados por mulheres indígenas “se alinham a questões relacionadas à condição feminina e ao que se chama de contracinema, que seria uma resposta feminista ao cinema tradicional”, citando Karla Holanda. Mudar e transformar pela via da percepção – por meio das cosmovisões que estão antes dos filmes, nesses filmes que acontecem junto com a vida. Essa foi a grande questão da minha tese. As imagens e os filmes das mulheres indígenas perturbam e reencantam o cinema, alargando nosso modo ver, pensar e fazer, sentindo, pensando e agindo, em um chamamento para ver com outros olhos – aquele olhar da manhã, a primeira abertura dos olhos depois de uma noite sonhando.
Ver não apenas com os olhos, mas com todo o corpo e sentimento, ver com os olhos dos pássaros, da capivara, da onça, ver como veem fungos, plantas, divindades; fazer as imagens de outro modo, em colaboração com as pessoas e outros agentes do mundo visível e invisível, encantando as imagens e o pensamento, criando teias de afeto e sonhos. Movimentando as imagens junto com a vida, porque acontecem com a vida. Esses são os cernes do sentipensamento que as mulheres originárias nos inspiram. Considero que há uma outra perspectiva do cinema e da arte indígena contemporâneos, com ênfase ao sentipensar no seio das filosofias ameríndias: uma ciência artesanal que se tece por meio da paixão, da respiração, daquilo que compartimos em coletivo; comprometida com a vida, porque se reconhece como parte dela. O sentipensamento é uma articulação que traz o envolvimento de outras partes do corpo para a sabedoria, aspecto que alinha cabeça, coração, mãos, pés, pulmão, entranhas… E perturba o sentido racional, binário e masculino do pensamento. Uma forma de realização cinematográfica que permite fazer-com, gestar-com com outros seres: fungos, plantas, bichos e humanos. São produções que servem aos interesses das mulheres indígenas, sem pensar em circuitos de festivais ou exibição externa às aldeias.
Mesmo para quem conhece um pouco da produção indígena no audiovisual, é impressionante que essa rede seja lançada com a participação de 76 mulheres cineastas de 32 etnias. Toda essa força evidentemente não surge de uma hora para a outra, é o resultado de décadas de trabalho. Você pode contar rapidamente como se formou essa comunidade do audiovisual de mulheres indígenas?
No Brasil, a formação dessa comunidade é realizada sobretudo por Instituições não indígenas e mais recentemente outros projetos e ONGs. Especificamente a formação de mulheres cineastas é conduzida sobretudo pelo Instituto Catitu. Algumas das cineastas aprenderam a filmar sozinhas ou pelo contato com comunicadoras(es) indígenas, mas o papel das oficinas audiovisuais indígenas, realizadas pelo Instituto Catitu, é importantíssimo para essa consolidação.
Como a rede se distribui territorialmente hoje? Há maior concentração de membras em algumas regiões?
Da Rede participam mulheres de todos os biomas, de diferentes regiões e povos, temos 32 etnias e até agora, 75 mulheres cineasta indígenas mapeadas. Algumas não conseguimos contato ainda, então fazem parte da Rede e constam no site 57. Temos a seguinte distribuição das mulheres por bioma: 15 da Amazônia; 7 da Caatinga; 16 do Cerrado; 18 da Mata Atlântica; 1 do Pampa. Infelizmente não temos nenhuma mulher do Pantanal, mas estamos articulando como resolver isso. Uma das potências da Rede é justamente diagnosticar onde precisamos atuar mais em formações audiovisuais, como por exemplo Caatinga e Pampa, para que essas atuações sejam ao menos mais próximas e não invisibilizem nenhum bioma ou mulher.
Nos últimos anos, tem sido notável a presença indígena em espaços importantes, não do “mercado” cultural, mas do “sistema da cultura”, como em exposições, mostras, livros, cursos, etc. Para citar apenas um exemplo, a 34ª Bienal de São Paulo teve a participação de inúmeros/as artistas indígenas, e um notável trabalho de curadoria de Jaider Esbell. Esta Rede surge também como parte desse momento/movimento de ocupação de espaços? Que tipo de espaços a Katahirine pretende ocupar?
Acredito que sim. Como falamos, a Rede é resultado de um longo processo e de alianças de trabalho e afetivas entre indígenas e não indígenas. A Rede quer ocupar um lugar político, principalmente. Antes de querer ser cinema, os filmes indígenas no Brasil são sobretudo sociopolíticos, ações comunitárias de reconhecimento, comunicação interna, enfrentamento diante do mundo não indígena e trocas de saberes, conectados ao pensamento, primeiro, político e, partindo daí, estético e possuem “como objetivo não o filme em si mas o que ele provoca em termos de reflexão e desencadeia nesse processo”, como escreveram Nadja Marin e Paula Morgado. O cinema indígena é, então, uma armadilha de caçar. No caso, nós somos a caça. Quem vai ao cinema, esperando assistir a algo “de índio”, depara-se com filmes da terra – e nós entramos na terra e na luta por ela, enquanto somos capturadas como espectadoras –; vemos algo construído a partir de uma estratégia comunal, de uma aldeia como proposição filosófica de vida e de se fazer uns nos outros, agindo mutuamente e se complementando em seus contrastes e coisas não duras – mas moles, pois se moldam, a partir da experiência vivida.
Já no seu lançamento, a rede Katahirine declara ter o desejo de incluir cineastas de povos de outros países da América Latina. Já há conversas nesse sentido?
Vamos estruturar e debater mais nacionalmente por enquanto, mas a ideia é expandir a rede por toda América Latina em breve. A Natali Mamani, indígena Aymara e imigrante, faz parte da equipe da Rede e do Catitu e é nossa primeira participante boliviana e brasileira.
Neste Dia Internacional da Liberdade de Imprensa, celebrado em 3 de maio, o Portal Catarinas e a plataforma Nem Presa Nem Morta lançam o guia “Boas práticas de cobertura feminista sobre aborto no Brasil”. A publicação gratuita, em versão digital, está disponível no site do Catarinas. O lançamento tem o apoio de Anis – Instituto de Bioética, Cladem, Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde e Coletivo Margarida Alves.
Diante do contexto de perseguição e criminalização de pessoas que abortam, de ativistas e de jornalistas ligadas às pautas feministas e de direitos humanos, o material sugere enquadramentos afirmativos e aponta boas práticas para um trabalho jornalístico mais seguro, como orientações para contato com fontes, sem correr riscos.
“Por que a imprensa trata do aborto somente nas páginas policiais?” é uma das questões abordadas para refletir sobre a forma como a cobertura jornalística, muitas vezes, retroalimenta o estigma do aborto, colocando em prática o imaginário negativo sobre esta prática, tão comum na sociedade. Em contrapartida a este enfoque recorrente, o guia destaca coberturas baseadas em evidências científicas e na afirmação de direitos, elencando exemplos de reportagens relevantes e emblemáticas sobre casos de violações dos direitos de meninas e mulheres.
“O guia é resultado de um encontro realizado em 2022, que reuniu jornalistas e comunicadoras de veículos tradicionais e de mídias independentes, com participação de advogadas defensoras dos direitos humanos, para trocar experiências e conhecimentos sobre a cobertura do tema”, explica Laura Molinari, que integra a Nem Presa Nem Morta.
“Partimos da compreensão de que o enquadramento dado às notícias sobre aborto, focado nos direitos fundamentais e humanos das pessoas que gestam e não na criminalização, como ocorre com frequência, não só contribui para qualificar o debate e garantir a efetivação dos direitos como, também, é parte da responsabilidade profissional de atuar para a construção da justiça social e de gênero”, afirma Morgani Guzzo, jornalista no Portal Catarinas.
De acordo com o material, falar de aborto com responsabilidade exige, entre outras recomendações, fugir do debate dualista “a favor ou contra”. “A contrariedade geralmente é forjada a partir de noções moralizantes que ignoram a ciência e a dignidade de cada pessoa, por isso, deve ser combatida com informação qualificada, e não fomentada”, diz trecho do guia.
A publicação contempla ainda boas práticas para não atribuir crimes a ninguém, de maneira a preservar jornalistas e fontes envolvidas de possíveis processos por injúria, difamação e calúnia, além de trazer um guia de bolso com noções de segurança digital para preservar o sigilo da fonte, que é dever e direito da/o jornalista.
O Código de Ética das/os Jornalistas Brasileiras/os expressa, em seu capítulo 1º, artigo 2º, que o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental. Por isso, jornalistas não podem admitir serem impedidos/as por qualquer tipo de interesse ou barreira.
“Nada mais oportuno do que tratar da cobertura do aborto no dia que evidencia a liberdade de imprensa. Por ser capturado pelo estigma, o assunto é constantemente interditado e alvo de desinformação. Convidamos jornalistas e comunicadoras à cobertura responsável e afirmativa, pautada na ciência, na saúde pública, e nos direitos humanos e fundamentais das meninas, mulheres e pessoas que gestam”, afirma Paula Guimarães, diretora executiva do Portal Catarinas.
Ficha técnica
Redação: Jess Carvalho, Letícia Vella e Mariana Prandini Assis
Redação final: Jess Carvalho
Edição: Laura Molinari, Morgani Guzzo e Paula Guimarães
Revisão: Laura Molinari, Letícia Vella, Mariana Prandini Assis, Morgani Guzzo e Paula Guimarães
Projeto gráfico e ilustrações: Maíra Zannon
Realização: Nem Presa Nem Morta e Portal Catarinas
Apoio: Anis – Instituto de Bioética, Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, Coletivo Margarida Alves e Cladem.
Serviço
O quê: Lançamento do guia “Boas práticas de cobertura feminista sobre aborto no Brasil”
Realização: Nem Presa Nem Morta e Portal Catarinas
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou, nesta quinta-feira (4), o decreto que recria o Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), o chamado Conselhão. O espaço é destinado a debater agendas e temas de interesse dos mais diversos segmentos da sociedade.
Brasileiras e brasileiros de todos os quadrantes do nosso país gostariam de ter a oportunidade que me está sendo dada neste momento de expressar a nossa gratidão por nos retirar do reino das trevas em que estivemos confinados por longos 4 anos. Você foi a nossa bala de prata e não falhou, você não nos faltou!
Obrigada presidente Lula por nos devolver a esperança de que outro país é possível; e que nele a superação da vergonhosa desigualdade racial promovida pelo racismo e a discriminação racial serão efetivamente combatidas, e é o que sinalizam os primeiros atos de seu governo anunciados pelo Ministério da Igualdade Racial sob a liderança da querida ministra Anielle Franco em 21 de março último, Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.
Falo intencionalmente em desigualdades raciais por ser uma noção que as viúvas de Gilberto Freire saudosas do mito da democracia racial costumam evitar.
Mas falo sobretudo porque os diferentes Índices de Desenvolvimento Humano encontrados para brancos e negros no Brasil refletem a coexistência, num mesmo território, de dois países apartados racialmente, sendo o IDH das pessoas brancas compatível com o de países desenvolvidos como a Bélgica, e o IDH dos negros brasileiros abaixo dos de países em desenvolvimento.
Então, sr. Presidente, no país de onde eu venho, jovens estão expostos ao genocídio pela ação ou omissão do Estado; no país de onde eu venho, mulheres negras apresentam crescimento exponencial de casos de feminicídio, no país de onde eu venho, a fome voltou a golpear a dignidade das pessoas, e no país onde eu venho, balas perdidas só encontram corpos de crianças negras privadas do direito de frequentar a escola pela violência cotidiana.
Então, o que esperar desse Conselho? Ele me parece umlocusprivilegiado para discutirmos essa série de questões que desafiam o nosso futuro como nação: E a primeira delas é: É eticamente aceitável persistir num projeto de país que não se importa em deixar para trás, no seu processo de desenvolvimento, a maior parte de sua população? Esse modelo de desenvolvimento desigual que caracteriza a nossa história é capaz de fazer o Brasil adentrar ao rol das nações desenvolvidas e civilizadas, ou estamos satisfeitos em ter ilhas de modernidade cercadas de atraso e indignidade humana por todos os lados? Se não, estamos dispostos a pagar o preço necessário a uma mudança estrutural de desenvolvimento econômico e social sustentável que pressuponha a correção e a reparação de injustiças históricas e contemporâneas persistentes em nossa sociedade em prol da efetivação da cidadania para todas, todes e todos nós?
Creio que das respostas a essas questões depende a capacidade ou não da sociedade brasileira de optar, dessa vez, por um desenvolvimento sustentável que permita radicalizar a democracia com equidade de gênero, equidade de raça e justiça social.
Entidades alertam que a militarização viola garantias constitucionais e os direitos de crianças, adolescentes, jovens e dos profissionais da educação.
Em defesa de uma educação democrática para crianças e adolescentes, com pluralidade, respeito às diversidades e aos direitos humanos, o Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social assina o documento que reivindica a anulação do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (PECIM). A Carta da sociedade civil pela desmilitarização da educação e da vida, endereçada ao governo federal, elenca motivos sociais e políticos para a revogação do decreto nº 10.004, de 05 de setembro de 2019, que instituiu o PECIM, além de propor medidas para o processo de desmilitarização.
“Por sua natureza disciplinar voltada para a promoção da obediência à hierarquia ancorada em bases militares, a militarização fere princípios constitucionais do ensino, como a liberdade de aprender e ensinar, o pluralismo de ideias, a valorização de profissionais da educação e a gestão democrática”, pontua o documento assinado por organizações sociais de todo o país. Além disso, ressaltam que “escolas militarizadas reforçam os estereótipos em relação aos papéis masculinos e femininos na sociedade, que limitam a liberdade dos indivíduos, coíbem a expressão da diversidade de gênero e sexualidade e a demonstração de afetos, principalmente de jovens LGBTQIA+”.
O PECIM foi lançado no governo Bolsonaro, em 2019, supostamente como solução para os principais problemas da educação nacional. Ainda na época, em menção ao programa, Bolsonaro relembrou, com nostalgia, o período da ditadura e de militares no poder. “Tem que botar na cabeça dessa garotada a importância dos valores cívicos-militares, como tínhamos há pouco no governo militar, sobre educação moral e cívica, sobre respeito à bandeira”, disse.
Embora tenha afirmado em discurso em defesa do programa que “o que tira um país da miséria e da pobreza é conhecimento”, o último governo marcou negativamente o setor educacional do Brasil, com desmontes sucessivos. Ao passo que unia esforços para o enfraquecimento da educação no país, sobretudo a educação pública, a militarização nas escolas foi a única agenda do governo Bolsonaro para o setor.
Como ressalta a carta, “em um país construído sobre as bases do autoritarismo, do racismo e do sexismo, que nunca levou a termo um processo de memória, verdade e justiça sobre as violências de Estado, a militarização é um fenômeno que vem incidindo sobre diversas esferas da vida”. As organizações também comentam sobre a presença violenta da militarização em territórios periféricos, constituindo também “uma violação do direito à educação de crianças, adolescentes e jovens, muitas vezes impedidos até de chegar à escola pela presença de agentes armados”.
Outro ponto é o fato de que escolas cívico-militares são instituições não militarizadas com uma equipe de militares no papel de tutores. “Militares não são educadores, não estão no rol de profissionais autorizados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (art. 61) a atuar na gestão das escolas ou em qualquer outra função típica dos trabalhadores da educação”, pontua a carta. Sendo assim, este modelo de escola gera disparidades organizacionais e salariais consideráveis entre oficiais e professores.
Além do Cendhec, entre as mais de duzentas entidades signatárias estão Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação, o Centro das Mulheres do Cabo (CMC), Centro de Cultura Luiz Freire (CCLF), Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e o Sindicato dos Trabalhadores da Educação do Município de Arcoverde (SINTEMA).
UNFPA e Abong se reúnem para pensar em ações conjuntas
Na passagem da Abong por Brasília, parte da diretoria executiva se reuniu com a Representante da UNFPA Brasil, Florbela Fernandes, para prospectar ações conjuntas de fortalecimento do campo dos direitos humanos no país. Na ocasião, Cibele Kuss, Keila Simpson, Henrique Frota e Franklin Felix foram porta-vozes das ações que a Abong vem realizando para a promoção e defesa das OSCs e da democracia.
“Saímos animados com a tarefa de pensar ações para o próximo período que possam abrir caminhos para as potencialidades das juventudes, das mulheres negras e da população LGBTQIAP+ por meio de uma escuta ativa, mapeamento das realidades e necessidades, assim como formações e atividades educacionais”, conta Franklin Felix, coordenador geral da Abong.
Neste período que marca a retomada dos projetos e políticas de defesa dos grupos historicamente em processo de vulnerabilização, a colaboração é a principal ferramenta de luta da sociedade civil organizada.
Parlamentares participam de café da manhã com representantes da Sociedade Civil
Na terça-feira (28),as organizações e movimentos sociais receberam bancadas, lideranças e frentes parlamentares para dialogar sobre os desafios e propostas para o fortalecimento da democracia a partir do trabalho e defesa das OSCs. A programação do dia também contou com apresentação do grupo de teatro “As Loucas de Pedra Lilás”, de Pernambuco.
Abong participa de reunião com a Deputada Federal Dandara Tonantzin
Durante o evento “Diálogos Pela Democracia”, os representantes da ABONG puderam conversar com a Deputada Federal Dandara Tonantzin sobre as agendas de fortalecimento da luta por direitos humanos no Congresso Nacional e também das organizações da sociedade civil, com foco para Minas Gerais, estado que elegeu Dandara nas últimas eleições.
Reunião na Secretaria de Participação Social
A participação da sociedade civil nas decisões da vida pública é essencial para contribuir com projetos e com o próprio fortalecimento da democracia. Durante a passagem pelo Congresso Nacional, a Abong representou suas associadas em reunião na Secretaria de Participação Social.
Durante a conversa, que contou com a presença das diretoras-executivas Cibele Kuss, Débora Rodrigues e Keila Simpson, assim como o diretor Henrique Frota e o coordenador-geral, Franklin Félix, a organização pontuou sobre a necessidade de fomentar caminhos que visem a presença das OSCs no governo, assim como sua sustentabilidade.
#NaMídia
O evento “Diálogos pela Democracia” foi notícia no Portal Catarinas. Leia a matéria na íntegra: bit.ly/3SZmdOY
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional foi recriado e isso significa muito para a luta por políticas públicas de combate à fome, assim como para a agricultura familiar. A presidenta do CONSEA-BA, Débora Rodrigues, membro da diretoria executiva da Abong, esteve em Brasília para a plenária que marcou esta retomada e também a volta do novo Bolsa-Família.
“A Abong sabe que a sociedade civil não parou de atuar mesmo com o desmanche dos conselhos e da participação social, mas agora voltamos com o CONSEA, e, como disse a presidenta Elisabetta Recine, o conselho voltou para incomodar, incidir, propor e monitorar as ações de combate à fome. Os estados também estão voltando para casa com muito trabalho para o nosso reencontro em novembro, quando acontecerá a Conferência Nacional de Segurança Alimentar”.